Startup brasileira conclui fórmula de remédio à base de cannabis

Fotografia mostra um frasco laranja de remédio aberto sobre uma esteira de bambu, onde se espalham buds de cannabis que saem do frasco.

A onda da legalização está chegando ao Brasil. Após a Anvisa declarar que regulará em breve o cultivo de cannabis para fins científicos, uma startup brasileira anuncia o desenvolvimento do primeiro medicamento à base de maconha 100% nacional. As informações são d’O Globo.

No momento em que se intensifica no país a discussão sobre cannabis medicinal, uma startup brasileira, a Entourage Phytolab, acaba de concluir o desenvolvimento de produto do que almeja ser o primeiro medicamento à base de cannabis produzido no Brasil. A pesquisa, feita em parceria com a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), chega a uma fase crucial: com a fórmula fechada, a ideia é que possa ser testada em humanos no primeiro semestre do ano que vem, e vendida nas farmácias em 2020.

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Embora muitos centros de pesquisa nacionais e internacionais apostem em estudos na área, apenas um medicamento à base de cannabis teve até hoje o registro aprovado na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Trata-se do Mevatyl, fabricado no Reino Unido pela GW Pharma Limited e registrado no Brasil pela empresa Beaufour Ipsen Farmacêutica Ltda. Atualmente, a diretoria da Anvisa discute em reuniões internas uma regulamentação para a liberação do plantio de cannabis para fins medicinais no país.

— O produto em si já está pronto, mas são necessários todos os testes “in vitro” (em animais e células), além dos clínicos de segurança e eficácia em pequena escala e larga escala. No curto prazo, o primeiro medicamento será à base de um extrato padronizado rico em canabidiol para a epilepsia refratária. Queremos ser os primeiros a produzir um medicamento à base de Cannabis totalmente em solo brasileiro — diz o farmacologista Fabrício Pamplona, diretor científico da Entourage Phytolab.

A ideia surgiu na vida do diretor da empresa, o advogado Caio Abreu, em 2009, quando perdeu a mãe, vítima de câncer. Na ocasião, ela chegou a usar cannabis para amenizar as dores pós-quimioterapia.

— Mas o tema se tornou irreversível na minha vida mesmo em 2014, quando fui convidado por um amigo para um evento sobre cannabis. O foco era no paciente, e na dificuldade que muitos tinham de ter acesso a um produto confiável sem cometer um crime — conta Caio.

O investimento total até o registro do produto, diz ele, chega a R$ 30 milhões, com aportes de sócios de Canadá e Holanda. A matéria-prima inicial para o estudo, aliás, veio do Canadá. Foram 10kg de cannabis importados em 2016, mas só liberados em janeiro de 2017, após passarem por uma série de trâmites exigidos pela legislação brasileira. Em seguida, entrou a equipe da professora Maria Ângela Meireles, que há 36 anos trabalha com desenvolvimento de processos – até então, nunca com a cannabis. Ela foi a responsável por extrair da planta uma mistura de compostos em determinada proporção (a fórmula é mantida em sigilo) com o objetivo de tornar o medicamento eficaz.

— Usamos uma tecnologia que serve para a obtenção de vários extratos de plantas e outros materiais sólidos. É chamada de extração super crítica porque usa o dióxido de carbono como solvente. E ainda é um processo verde, limpo, porque não afeta o meio ambiente nem a saúde, e ainda traz o benefício de, nesse caso, ser um produto medicinal — conta a professora da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp.

Segundo Maria Ângela, o que torna esse processo diferente de outros é que ele é feito a uma pressão alta, bem acima da pressão atmosférica, em condições em que o dióxido de carbono consegue solubilizar, ou seja, remover da planta o material de interesse. Quando o sistema volta para a pressão atmosférica, o dióxido de carbono é liberado e vira um gás de novo.

— As plantas oferecem oportunidades únicas de se produzir medicamentos. O Brasil é referência mundial em disponibilidade de flora, embora nesse caso se trate de uma planta que está sendo importada. Mas tudo depende do uso que se dá. Nessa pesquisa, lidamos com uma planta que tem aplicações para algumas patologias que não têm alternativa — opina a professora.

O extrato bruto produzido na Unicamp foi transferido para o laboratório da Entourage, no interior de São Paulo, onde seguem os testes. Os pesquisadores estão otimistas.

— O momento é ótimo. Segundo declarações públicas do presidente da Anvisa, estamos em vias de iniciar o processo regulatório para termos cultivo para fins científico no Brasil, e provavelmente teremos o que chamamos de “mercado de acesso”, que possibilita a distribuição de produtos com qualidade farmacêutica enquanto ainda estão sendo realizados os testes necessários para o registro de produto. Esse foi o caminho tomado por Canadá e Israel, por exemplo, e já que foi bem sucedido, serve como exemplo para o Brasil — conclui Pamplona.

Em nota, a Anvisa afirmou que pode contemplar novos produtos à base de cannabis caso novos pedidos de registro de medicamento sejam apresentados “e sejam comprovadas eficácia, segurança e qualidade de tais produtos”. Até o momento está permitida a venda de medicamentos registrados na Anvisa que possuam em sua formulação derivados de Cannabis sativa, em concentração de no máximo 30 mg de tetrahidrocannabinol (THC) por mililitro e 30 mg de canabidiol por mililitro, segundo a agência.

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#PraCegoVer: fotografia de capa de um frasco de plástico de cor âmbar tombado sobre uma esteira de bambu e flores de maconha em seu interior e fora.

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