“Queiroz me perseguiu por que tenho uma folha da maconha tatuada”, diz professor Pedro Mara

Fotografia que mostra Pedro Mara de lado e olhando para a câmera, com máscara e luva brancas, enquanto aponta o punho cerrado para cima; ao fundo, outras pessoas em um calçadão e um ambiente arborizado. Foto: arquivo pessoal.

Uma simples tatuagem de folha de maconha no antebraço foi o estopim para a perseguição do professor que atualmente está afastado por motivos de segurança. Entenda mais sobre o caso na entrevista concedida ao historiador Henrique Oliveira*

Há três anos, o professor carioca Pedro Mara, de 31 anos, começou a ser perseguido pela família Bolsonaro, quando na época o então deputado estadual Flávio Bolsonaro, atualmente senador, resolveu acionar o Ministério Público e a Secretaria Estadual de Educação, para pedir o seu afastamento da escola onde lecionava a disciplina de sociologia e da direção do Ciep 210, em Belford Roxo. Motivo? Apologia ao uso de drogas, pelo fato de Pedro Mara ter uma folha da maconha tatuada no antebraço.

Pedro Mara fez a tatuagem em 2012 e nos disse qual foi o motivo de ter escolhido a folha da maconha: “eu era próximo da cultura rastafári, eu fiz a tatuagem de uma folha e fiz do Leão de Judá, que não tem nada a ver com a apologia. Eu entrei com ela para trabalhar no Estado, e só algum tempo depois o Flávio Bolsonaro começou a questionar”.

A tatuagem também é uma demarcação política de luta contra a guerra às drogas, além de ser envolvido com movimento social da educação, Pedro Mara tem um histórico de militância no movimento antiproibicionista do Rio de Janeiro, “participei da Marcha da Maconha em Ipanema, tanto de outras que a gente conseguia realizar em outras partes da cidade, como na zona oeste, na Ilha do Governador e da Marcha da Maconha de Niterói. Inclusive, foi essa participação que o Flávio Bolsonaro utilizou por meio de fotos coletadas provavelmente nas redes sociais, para tentar dizer que eu faria apologia à maconha”.

A representação feita por Flávio Bolsonaro, em julho de 2017, foi arquivada em outubro do mesmo ano pela Promotoria de Justiça de Proteção à Educação, do Núcleo de Duque de Caxias. Nós sabemos que Flávio Bolsonaro utiliza a proibição das drogas para atacar e criminalizar seus opositores políticos, para quem não lembra, em 2016 ele protagonizou uma cena vexatória acusando Marcelo Freixo (PSOL) de querer criar a “bolsa larica”, durante o debate das eleições para a prefeitura, por que Marcelo Freixo defende a legalização das drogas. Esse também foi o fatídico debate em que Flávio Bolsonaro teve um mal-estar e desmaiou.

Pedro Mara e Flávio Bolsonaro se conheceram justamente num momento de divergência política entre os dois, em meio às discussões sobre o projeto “Escola Sem Partido”, que era defendido por Flávio Bolsonaro. Em sua análise, a acusação de apologia à maconha foi justamente para deslegitimar a sua posição contrária ao projeto, “Flávio Bolsonaro está num espectro político e eu tô no outro, além do fato de seu ser negro e gay, era o prato cheio que ele gostaria de tentar pintar uma realidade que não existe, que só existe na cabeça dele e nas ações fascistas que eles tentam implantar, com o objetivo de me tirar da direção da escola”.

Ao longo das investigações acerca do assassinato da ex-vereadora Marielle Franco (PSOL), e do motorista Anderson Gomes, se descobriu que o principal acusado do crime, o ex-policial militar Ronie Lessa, envolvido com um grupo de matadores profissionais e milicianos, fez uma pesquisa na internet para saber mais detalhes da vida de Pedro Mara. Essa busca ocorreu logo após os embates envolvendo Pedro Mara e Flávio Bolsonaro, em julho de 2017.

No mês passado veio à tona que durante uma audiência pública na Câmara de Vereadores de Niterói, sobre o projeto “Escola Sem Partido”, o discurso de Pedro Mara foi filmado por Fabrício de Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro, que se tornou conhecido por causa das investigações sobre o esquema de “rachadinhas” e desvio de dinheiro público na Assembleia Estadual do Rio de Janeiro.

Imagens obtidas pelo jornal O Globo demonstraram que Queiroz acompanhava Flávio Bolsonaro nessa audiência e filmou todo o discurso de Pedro Mara, no qual ele chegou a dizer “não acredito que Bolsonaro é a solução do país. Ele é parte do problema”. Hoje, em 2020 estamos percebendo isso, infelizmente. Dois meses após essa audiência, Flávio Bolsonaro fez a denúncia ao Ministério Público e pediu o afastamento de Pedro Mara.

A filmagem realizada por Fabrício de Queiroz reafirma mais ainda as profundas relações existentes entre a família Bolsonaro e o crime organizado do Rio de Janeiro, em que “o Fabrício de Queiroz é o elo da família Bolsonaro com a Milícia, porque com coincidência eu apareci na lista das pessoas pesquisadas pelo ex-sargento Ronie Lessa, que participa de uma organização chamada de Escritório do Crime, mas quem organizou os ataques contra mim foi o Fabrício de Queiroz”.

Após saber que estava fazendo parte de uma lista de possíveis alvos de um grupo de matadores, Pedro Mara precisou se afastar do trabalho, só que ao invés de ser protegido, a Secretaria de Educação abriu um processo de exoneração contra ele. Atualmente, Pedro Mara se encontra formalmente afastado da escola e sem receber salário, no vídeo abaixo ele conta com mais detalhes a sua situação, pois, como ele bem nos relatou: “eu só fiz a tatuagem de uma planta. Apenas isso”.

*Henrique Oliveira é historiador e militante antirracista contra a proibição das drogas.

Leia também: Sepe-RJ, OAB e Justiça Global relatam situação do professor Pedro Mara à ONU

#PraCegoVer: em destaque, fotografia que mostra Pedro Mara de lado e olhando para a câmera, com máscara e luva brancas, enquanto aponta o punho cerrado para cima; ao fundo, outras pessoas em um calçadão e um ambiente arborizado. Foto: arquivo pessoal.

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