Quando prescreve o crime de porte de drogas para uso pessoal?

Fotografia em close do topo de um bud de maconha de sugar leaves e cálices em tons de roxo, repletos de tricomas, e pistilos laranjas, em fundo cinza-escuro. Imagem: THCamera Cannabis Art.

A Lei de Drogas estabelece que prescrevem em dois anos a imposição e a execução das penas

Denomina-se prescrição a perda do direito de punir do Estado, pelo decurso de tempo, em razão do seu não exercício dentro do prazo previamente fixado (Bitencourt, 2011, p. 810).

Caso concreto

Para facilitar a visualização de quando prescreve o crime de porte de drogas para uso pessoal na prática, vejamos um caso que, em tempos de pandemia, acredito que será frequente nos tribunais pelo país afora.

Determinada pessoa que fazia uso adulto de drogas ilícitas foi acusada de importar, em 2 de outubro de 2018, sem autorização, dez comprimidos de LSD vindos da Holanda (Países Baixos) e enviados para o Brasil por correspondência.

Após procedimento de rotina (análise por escâner etc.), a correspondência foi retida por funcionário dos Correios em Curitiba (PR), que, suspeitando tratar-se de conteúdo ilícito, encaminhou o material para a Polícia Federal.

Uma vez aberta a correspondência e periciados os comprimidos, concluiu-se que a substância era proibida no Brasil, estando configurado crime previsto na Lei de Drogas.

Considerando, no entanto, que a importação da droga ocorreu para consumo pessoal, a conduta foi enquadrada no art. 28, caput, da lei nº 11.343/2006 e o caso encaminhado ao Juizado Especial Criminal (Jecrim) competente.

Prazo

Se por um lado, a dogmática penal tradicional ensina que uma vez praticado o crime nasce para o Estado o direito de punir o seu autor, por outro, não pode o acusado permanecer à disposição desse mesmo Estado indefinidamente, de modo que o Direito Penal dispõe de institutos que fulminam o jus puniendi quando demonstrada a falta de interesse estatal na imposição e/ou execução da pena em um prazo razoável legalmente determinado.

Tendo em vista, então, a opção brasileira de criminalizar o comportamento daquele que “adquire, guarda, tem em depósito, transporta ou traz consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”, a Lei de Drogas prevê, em seu art. 30, quando prescreve o crime de porte de drogas para uso pessoal, vejamos: “prescrevem em 2 anos a imposição e a execução das penas”.

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Voltando ao caso com o qual iniciamos, para sabermos quando prescreve o crime de porte de drogas para uso pessoal, é preciso observar a data em que a correspondência com os comprimidos de LSD foi retida pelo funcionário dos Correios, a saber, 2 de outubro de 2018.

O dia 2 de outubro de 2018 indica, portanto, o momento em que o crime se consumou, ou seja, quando a droga proibida pela Anvisa (Portaria nº 344/1998) ingressou no território brasileiro, uma vez que estamos falando de importação (i.e., trazer de fora do país).

Conforme estabelece o Código Penal, é a partir desse momento que começa a correr o prazo de 2 anos previsto no art. 30 da Lei de Drogas para que o Estado puna legitimamente o autor do fato criminoso.

Considerando que desde a data em que o crime se consumou transcorreu período de tempo superior aos 2 anos previsto na Lei nº 11.343/2006 para que o Estado imponha a pena, sem que se verifique nenhuma hipótese de suspensão ou interrupção do prazo prescricional, é de se concluir que, nesse caso, está extinto o direito de punir o autor do fato previsto no art. 28 da Lei de Drogas.

Pandemia

É importante esclarecer que a situação de pandemia provocada pelo novo coronavírus não configura hipótese de suspensão ou interrupção do prazo prescricional, uma vez que não prevista em lei, como exige o princípio da legalidade em matéria de Direito Penal (art. 5°, XXXIX, da Constituição Federal).

Concluindo, por acreditar que casos semelhantes surgirão nos tribunais pelo Brasil afora, oriento que você, leitor, fique atento ao instituto da prescrição e, conforme for, analise se já não ocorreu a extinção da punibilidade do fato, uma vez que o reconhecimento da prescrição pode conduzir a situação mais favorável quando comparada, por exemplo, com a gerada ao aceitar proposta de transação penal.

Referências

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Geral. 16ª edição. São Paulo: Saraiva, 2011.

LIMA, Renato Brasileiro de. Legislação Criminal Especial Comentada. 8ª edição. Bahia: Juspodivm, 2020.

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#PraCegoVer: fotografia, em close, do topo de um bud de cannabis que apresenta sugar leaves e cálices em tons de roxo, repletos de tricomas, e pistilos laranjas, em fundo cinza-escuro. Imagem: THCamera Cannabis Art.

Sobre Thiago Knopp

Especialista em Criminologia, Direito e Processo Penal (UCAM). Advogado Criminalista inscrito na OAB/RJ sob o n. 165.680
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