Quais as implicações dos limites de THC para o cânhamo industrial?

Fotografia que mostra uma plantação de cânhamo, com algumas plantas mais altas nas laterais da imagem, que divide a linha do horizonte com um céu azul e o sol que aparece ao fundo e concentrado em um ponto.

Diante dos limites de 0,3% de THC em vários países, destacam-se as regulamentações mais recentes com maiores percentuais. Saiba mais com as informações do Industria Cannabis

Nos últimos anos, em muitos países, tem havido debates sobre o conteúdo de tetraidrocanabinol (THC) das plantas de Cannabis sativa para uso na indústria e na área médica. A União Europeia (UE), por exemplo, estabelece um limite de 0,3% de THC para cultivos de uso industrial e farmacêutico. Mas, atualmente, a Associação Europeia de Cânhamo Industrial (EIHA, na sigla em inglês) está lutando para elevar esse limite para 1%, por considerá-lo muito rígido. Assim, em várias partes do globo, passa a existir um movimento comumente conhecido como “o Clube do 1%”, que é formado por países que flexibilizaram a legislação vigente em relação a esses limites de THC e passaram a permitir que as safras contenham essa porcentagem. É o caso do Uruguai, Malawi, África do Sul, Tailândia e, mais recentemente, Equador.

Segundo José Dávalos, presidente da Ecuacáñamo, em comunicação com o Industria Cannabis, “na América do Sul 1% é considerado um valor que pode padronizar o cânhamo no comércio sul-americano”. E acrescentou que a vantagem deste limite é que “dá margem para trabalhar com a planta, porque o THC pode subir devido a questões que vão desde a genética da semente que foi plantada ao estresse que a planta pode sofrer devido a diferentes fatores ambientais”.

Diana Barreneche, presidente do “Proyecto Cáñamo Argentina”, afirmou que “1% é uma recomendação dos agrônomos”. Ela explica também que, na Argentina, se promovermos a indústria do cânhamo, devemos levar em conta esse percentual como limite para começar. (Barreneche esteve presente na assessoria para a elaboração de um projeto de lei apresentado no Congresso argentino pela deputada Mara Brawer, da Frente de Todos, que estabelece limite de 1% de THC para o cânhamo industrial.)

A presidente do Proyecto Cáñamo explicou que a utilização desta margem se deve ao fato de que na Argentina não há tanto desenvolvimento de conhecimentos sobre a planta e sua adaptação ao solo, portanto, estabilizar a genética levará tempo. Se na Argentina for estabelecido um limite de 0,3% como na EU, e considerando as leis sobre entorpecentes, que consideram a cannabis acima desse percentual como “psicoativa”, muita produção será perdida.

O limite de 1% de THC é realmente muito baixo, considerando que a maioria das cepas de Cannabis sativa contém um teor médio de THC de 20%. “Precisamos de flexibilidade por que temos que estabilizar a genética, temos que ver o rendimento dessa safra, saber como a semente que estamos cultivando em nosso solo e dentro das nossas condições climáticas vai se desenvolver”, disse Barreneche à Industria Cannabis. Além disso, ela observou que “quem quiser exportar produtos derivados do cânhamo para a Europa deve cumprir esse 0,3%, se não, até o momento, não o receberão”.

José Dávalos, por sua vez, disse a este respeito que “esta desvantagem não é algo que possa prejudicar o negócio, porque hoje existe tecnologia que permite reduzir o THC presente na planta”.

No caso equatoriano, com as recentes regulamentações sobre este percentual na produção destinada à indústria e ao campo medicinal, pode ser observado com firmeza as oportunidades de negócios que o cultivo da cannabis abre.

“A cadeia de valor do cânhamo é extensa, tem mais de 50 mil produtos. Essa cultura é utilizada para a reconversão de muitas plantações como o cultivo de banana ou flores, dando origem a safras especializadas mais extensas”, observou Santiago Trejo, consultor de Assuntos Regulatórios da Sensitive Industries, em declarações à imprensa equatoriana. O Ministério da Agricultura e Pecuária do Equador emitiu em outubro de 2020, um regulamento para a produção, comercialização e exportação de cannabis não psicoativa e cânhamo industrial no país. Para estimular a produção, existem sete tipos de licenças.

A primeira licença é para importação e comercialização de sementes; a segunda é destinada à produção e comercialização de sementes e mudas; a terceira é dedicada à produção de cannabis não psicoativa e cânhamo industrial (o que permite a participação em toda a cadeia); a quarta à produção de cânhamo industrial; a quinta ao melhoramento genético e bancos de germoplasma; enquanto a sexta destina-se à produção e processamento de derivados e a sétima à comercialização e exportação.

“Cânhamo gera mais empregos e opções de desenvolvimento que a cannabis medicinal”

José Dávalos disse que o processo de licenciamento é muito simples e pouco burocrático, uma vez que são solicitadas informações “muito básicas” para obtê-lo. A este respeito, explicou que “a espinha dorsal do pedido de licenças é a apresentação de um plano agrícola, que informe o Estado sobre o que vai ser semeado, com que técnica, qual será o procedimento de colheita e pós-colheita, e para que está destinada a colheita”. E acrescentou que em breve o ministério vai emitir uma tabela com os valores das taxas para processar cada licença.

Um dos documentos necessários para a obtenção das licenças acima mencionadas é a certidão de antecedentes criminais (como lavagem de dinheiro ou tráfico de drogas), tanto do representante legal, quanto dos diretores, sócios, acionistas ou membros com participação acionária superior a 6% do capital das empresas, uma vez que por enquanto as licenças serão emitidas apenas para pessoas jurídicas. A produção mínima para obter a licença é de dois hectares. Segundo representantes do ministério, isso é feito para evitar especulações no setor. O objetivo é que, em cinco anos e com observações mais concretas sobre o mercado, as licenças possam ser estendidas para áreas menores.

Sobre o panorama equatoriano, Dávalos analisou que “há muita gente empolgada com a saída das licenças, que veem o cânhamo como uma oportunidade para fazer o país avançar, porque gera investimento, gera trabalho, e também no devido tempo vai gerar pagamento de impostos; então é realmente atraente”. Além disso, afirmou que “não devemos deixar que a ansiedade nos domine, ainda há muito o que planejar e ainda há um longo caminho a percorrer para ver as lavouras de maconha” e que “ainda temos que cumprir os processos para importar sementes legalmente aqui no Equador. Acho que é um processo que começou, mas temos que esperar um pouco para ver as primeiras safras ”.

É fundamental entender que esse limite de 1%, aliado à emissão de licenças simples, serviria de trampolim para que mais startups e empresas se integrem a um setor que está em ascensão mundial e no qual a Argentina também tem um potencial que a colocaria em destaque entre os países da região, ao lado da Colômbia, Uruguai e Equador. Dávalos sintetizou essa ideia de forma precisa, prevendo o sucesso da indústria da cannabis em seu país com quatro elementos centrais: “pela quantidade de interessados, as terras disponíveis no país, as condições climáticas excepcionais para a planta e o interesse que o governo tem demonstrado em permitir que essa indústria se desenvolva sem maiores obstáculos”.

Na América Central, um espelho da experiência equatoriana

Países como Costa Rica e Panamá observam a experiência equatoriana de perto e estão trabalhando nisso. O projeto de lei apresentado pela deputada Zoila Volio em setembro de 2020, que afirma que os limites de THC fixados internacionalmente são de 1%, obteve parecer favorável na Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa da Costa Rica. A liberdade de cultivo do cânhamo também se estabelece para sua produção, industrialização e comercialização, ao passo que irá autorizar o cultivo de cannabis apenas para fins médicos ou terapêuticos.

No caso panamenho, os avanços foram mais longe: o projeto de lei “pelo qual se promove o desenvolvimento do agronegócio do cânhamo para impulsionar o setor agrícola nacional”, segundo seu título, foi apresentado em outubro de 2019 e apenas no final de outubro de 2020 foi colocado em um primeiro debate na Comissão de Comércio e Assuntos Econômicos da Assembleia Nacional do Panamá. A iniciativa proposta pela deputada Kayra Harding define o cânhamo como “a planta da cannabis e qualquer uma de suas partes cuja concentração de THC não seja superior a um e meio por cento (1,5%) em peso seco”.

Leia também: Quatro previsões ousadas para a indústria do cânhamo em 2021

#PraCegoVer: em destaque, fotografia que mostra uma plantação de cannabis, com algumas plantas mais altas nas laterais da imagem, que divide a linha do horizonte com um céu azul e o sol que aparece ao fundo e concentrado em um ponto.

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