“A Vida é Loka”: Juíza inicia decisão sobre tráfico de drogas com poema
Karla Avelino de Oliveira, da 4ª Vara da Infância e Juventude de RS, usou o poema “A vida é loka”, de Sérgio Vaz, para retratar a realidade de crianças e adolescentes em ambientes dominados por organizações criminosas. Informações do Correio Braziliense
Uma juíza de Porto Alegre (RS) deixou de lado a formalidade dos textos jurídicos e usou poesia para explicar o caso de um adolescente acusado de tráfico de drogas. A magistrada Karla Avelino de Oliveira, da 4ª Vara da Infância e Juventude do estado, considerou que o jovem estava em situação de trabalho infantil e começou a sentença com um poema que retrata a realidade de crianças e adolescentes em ambientes dominados por organizações criminosas.
O poema foi reproduzido logo na primeira página da decisão de 22 laudas. Intitulado A Vida é Loka (leia a íntegra ao final), de Sérgio Vaz, o texto aponta a realidade violenta de crianças e adolescentes nas periferias do Brasil. Em um trecho, o autor faz o uso metafórico da palavra “arma” para salientar que, por meio das armas da cultura e educação, o sujeito ganha poder e conhecimento para mudar seu destino.
No caso em questão, o Ministério Público ofereceu representação contra o adolescente pela prática de tráfico de drogas e se manifestou contra decisões judiciais que afastariam a responsabilização socioeducativa, “ainda que entenda que se deva combater toda e qualquer forma de trabalho infantil”.
A magistrada, no entanto, não atendeu ao pedido do MP. Ao julgar o pedido improcedente, a juíza fez uma extensa dissertação sobre a situação dos adolescentes na cadeia do tráfico de drogas.
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A juíza também relata que desde 1997, ano que passou a integrar o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, sempre se questiona sobre qual é a sua contribuição “para a permanência das desigualdades estruturais”. No entendimento da magistrada, a prática do tráfico de drogas baseado na exploração por parte das organizações criminosas do trabalho de adolescentes vulneráveis constitui trabalho infantil, e às vezes esta é a única opção para conseguir acesso à saúde e alimentação.
“Para uma parcela dos jovens que estão à margem desse sistema, sem acesso à educação de qualidade, moradia, saneamento, renda, direito ao trabalho, trabalhar para o tráfico traduz-se em uma forma (talvez a única) de sair do anonimato, desse lugar estéril para concretizar o acesso a alguns desses direitos, como trabalho, saúde e alimentação”, escreveu Avelino na sentença.
Por fim, a magistrada julgou improcedente a representação do MP, no sentido de afastar a possibilidade de impor responsabilização socioeducativa ao trabalhador infantil. A juíza também oficiou a Fundação de Assistência Social e Cidadania de Porto Alegre (FASC) para que adote as providências pertinentes que tenham por base o “Protocolo de Gestão Intersetorial do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil”.
Por envolver menores, o caso julgado por Avelino está sob segredo de Justiça.
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Leia o poema:
Esses dias tinha um moleque na quebrada com uma arma de quase 400 páginas na mão.
Umas minas cheirando prosa, uns acendendo poesia.
Um cara sem nike no pé indo para o trampo com o zóio vermelho de tanto ler no ônibus.
Uns tiozinho e umas tiazinha no sarau enchendo a cara de poemas. Depois saíram por aí vomitando versos na calçada.
O tráfico de informação não para.
Uns estão saindo algemados aos diplomas depois de experimentarem umas pílulas de sabedoria. As famílias, coniventes, estão em êxtase.
Esses vidas mansas estão esvaziando as cadeias e desempregando os Datenas.
A vida não é mesmo loka?
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#PraTodosVerem: fotomontagem que traz a foto, em P&B, de uma mão jovem segurando um feixe de canetas com o punho cerrado, à frente da ilustração de uma lousa com a maior parte pintada de giz claro, em tom de sépia, e um pixo rosa-choque ao centro. Imagem: Lunetas.
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