O esforço para sindicalizar os trabalhadores da cannabis nos EUA, entenda

Fotografia de um grande pote cônico transparente, contendo flores secas de maconha, sobre uma balança, e, logo atrás, parte do corpo de uma pessoa vestindo camiseta de manga longa preta sob outra de manga curta em cor verde-claro; a foto foi tirada no interior de um dispensário da Califórnia. Trabalhadores.

Nos EUA, à medida que os estados aprovam leis permitindo que as empresas se estabeleçam na indústria da maconha, continua crescendo a demanda por trabalhadores no setor e a necessidade de se criar sindicatos que protejam seus direitos. As informações são do Vox

Trabalhadores da erva em todo o país estão se sindicalizando, e a Califórnia apenas facilitou para eles.

No último dia 11, o governador Gavin Newsom assinou uma lei que exige que todas as lojas de cannabis celebrem os chamados “acordos de paz no trabalho” assim que tiverem 20 ou mais funcionários.

A Califórnia é agora um dos dois estados – Nova York é o outro – que exigem que as lojas de maconha licenciadas façam um acordo com um sindicato formal, no qual os gestores prometem não impedir os trabalhadores de ingressar em um sindicato. E, em troca, os sindicalistas não incentivarão greves trabalhistas contra a empresa.

Os sindicatos têm pressionado por esses acordos nos últimos anos, à medida que mais e mais estados descriminalizam a maconha. Eles dizem que querem garantir que a indústria de US$ 6 bilhões não explore os trabalhadores, que costumam ser pagos abaixo do salário mínimo ou receber maconha em vez de salários.

Eles também veem isso como um caminho para os trabalhadores formarem um sindicato e aumentarem o número de membros. Quando sindicalizados, os trabalhadores de cannabis acabaram negociando aumentos anuais, subsídios de seguro de saúde e salários acima da média, de acordo com a União Internacional dos Trabalhadores da Alimentação e do Comércio (UFCW, nas siglas em inglês), que organiza trabalhadores de cannabis em todo o país desde 2011.

A Califórnia exige que as lojas de cannabis assinem acordos de paz trabalhista desde 2018, depois que os eleitores aprovaram uma cédula que legalizou as vendas de maconha para uso adulto. Havia apenas um problema: a lei não incluía uma maneira de fazer cumprir os acordos, porque não estabelecia prazo às empresas para fazê-los.

A nova lei concede às empresas 60 dias para fazê-lo. Caso contrário, os trabalhadores podem registrar uma queixa junto às autoridades reguladoras do trabalho.

Isso “fornecerá aos funcionários clareza quando um empregador não cumprir as leis e uma reclamação precisar ser apresentada”, disse Reggie Jones-Sawyer, membro da assembleia da Califórnia que patrocinou a lei, de acordo com o site de notícias da indústria Cannabis Wire.

Embora a nova lei represente um pequeno ajuste na lei atual, ajudará os sindicatos a fazer incursões em uma das indústrias que mais crescem. Também representa uma abordagem incomum para a organização do trabalho.

Acordos de paz no trabalho

A emergente indústria legal da maconha conta com uma rara estratégia trabalhista usada para organizar trabalhadores de estaleiros e funcionários de cassinos. Eles são conhecidos como acordos de paz no trabalho.

Cada acordo varia de local de trabalho para local de trabalho, dependendo do que os dois lados negociam, mas eles tendem a ter algumas coisas em comum.

Primeiro, os gestores da empresa concordam em não dissuadir os trabalhadores de sindicalizar, e geralmente concordam em fornecer as informações de contato dos funcionários aos sindicalistas. Eles também dão aos sindicatos acesso ao local de trabalho para se encontrarem com funcionários, desde que os sindicalistas não interrompam o trabalho.

Em troca do acesso, os sindicalistas concordam em não difamar uma empresa ou dizer coisas negativas sobre o empregador aos seus funcionários. Os sindicatos também concordam em não incentivar os trabalhadores a entrar em greve ou piquete.

Como o termo sugere, esses acordos visam manter a paz durante o que muitas vezes pode se tornar um processo de sindicalização tenso. Mas a configuração só funciona quando os empregadores não estão tentando impedir que os trabalhadores se organizem todos juntos.

Para a indústria legal da maconha, esses acordos às vezes são obrigatórios sob a lei estadual. Além da Califórnia, Nova York exige que seus dispensários de maconha medicinal assinem acordos de paz trabalhista. Em Illinois, que recentemente legalizou a maconha para uso adulto, o estado analisará se uma empresa assinou um acordo ao determinar quais lojas podem obter uma licença.

Sindicatos, como a União Internacional dos Trabalhadores da Alimentação e do Comércio, vêm pressionando os estados a aprovarem essas leis. Eles veem isso como uma maneira de aumentar a filiação sindical em um setor em rápido crescimento.

À medida que a indústria da maconha cresce, cresce também a demanda sindical

Dez estados legalizaram totalmente as vendas de maconha nos últimos anos, para consumo medicinal ou adulto. Cerca de outra dúzia de estados permite vendas para uso médico. À medida que mais e mais estados aprovam leis que permitem que as empresas se estabeleçam, a demanda por trabalhadores continuará aumentando.

É difícil determinar quantas pessoas trabalham na indústria da cannabis. Como a venda de maconha ainda é ilegal sob a lei federal, o Departamento do Trabalho dos EUA não acompanha o crescimento do emprego na indústria. Mas a New Frontier Data, uma empresa de pesquisa de mercado e análise de dados sobre cannabis, estima que a indústria legal empregue pelo menos 250.000 pessoas que trabalham diretamente com a planta. Isso inclui pessoas que trabalham em dispensários, cafeterias, padarias, centros de identificação de pacientes, lojas de hidroponia e instalações de cultivo.

Leia mais: Indústria da maconha gera 210 mil empregos nos EUA

E o crescimento de dispensários de maconha é uma tendência à qual os sindicatos estão prestando atenção.

A União Internacional dos Trabalhadores da Alimentação e do Comércio, mais conhecida por organizar funcionários de supermercados, é agora o “sindicato da maconha mais poderoso” do país, representando mais de 10.000 trabalhadores em 14 estados, segundo a revista Rolling Stone.

“Negociou contratos com grandes operadoras como a MedMen, ajudou a legitimar o movimento para políticos cautelosos e estabeleceu disposições pró-trabalhadores em várias legislaturas estaduais”, escreveu Josh Marcus para a Rolling Stone.

De fato, foi a UFCW que forçou o governo federal a fazer valer os direitos trabalhistas dos trabalhadores de cannabis. Em 2013, trabalhadores de uma empresa de maconha medicinal, Wellness Connection of Maine, saíram do trabalho naquele inverno, protestando contra o uso de pesticidas pela empresa. A empresa revidou repetidamente contra os trabalhadores por tentarem se sindicalizar com a UFCW e disciplinou vários trabalhadores que participaram da paralisação, de acordo com o Conselho Nacional de Relações Trabalhistas (NLRB, nas siglas em inglês), que aplica as leis federais de negociação coletiva.

Em outubro de 2013, a empresa resolveu o caso. Ao fazer isso, o NLRB reconheceu que os trabalhadores de cannabis estavam protegidos pela Lei Nacional das Relações Trabalhistas – a lei de 1935 que dava aos trabalhadores o direito de sindicalizar.

“Somente nos unindo, nós conseguimos encontrar forças para falar sobre as violações graves que vimos no trabalho”, disse Ian Brodie, ex-funcionário da Wellness, em comunicado após o acordo. “Ao lutar por nosso sindicato, estamos protegendo nossos clientes e moldando a indústria da maconha medicinal em uma indústria segura e bem regulamentada que fornece bons empregos e remédios necessários para a nossa comunidade”.

As empresas de cannabis gostam mais dos sindicatos do que a maioria dos empregadores

É incomum uma empresa anunciar o fato de que seus funcionários estão sindicalizados. Mas na indústria legal da maconha, isso é normal – um sinal de que a empresa é um negócio legítimo, e não um operador obscuro que cultiva maconha na garagem de alguém.

Em agosto de 2018, os funcionários dos dispensários da Have a Heart assinaram o primeiro acordo coletivo de trabalho para os trabalhadores de maconha no estado de Washington. A empresa chegou a escrever um comunicado à imprensa para anunciar: “Nós sempre nos esforçamos para ter um impacto positivo nos bairros onde fazemos negócios, e vemos nossa parceria [com a UFCW Local 21] como parte de nosso compromisso de criar um ambiente seguro e fortalecedor no local de trabalho”, escreveu o CEO Ryan Kunkel.

O contrato, que abrange cerca de 135 trabalhadores na área de Seattle, inclui benefícios abrangentes de assistência médica, aumentos anuais e taxas salariais acima da média para a indústria, de acordo com o comunicado. As vendas de maconha para uso adulto são totalmente legais sob a lei do estado de Washington.

Na segunda semana deste mês, os trabalhadores de cannabis na Pensilvânia assinaram o primeiro acordo coletivo de trabalho do setor no estado, de acordo com a UFCW (Local 1776). Eles trabalham para a Pennsylvania Medical Marijuana Solutions, uma subsidiária da Vireo Health, que opera em 11 mercados com cannabis legal.

O novo contrato estabelece salários-base para os funcionários e oferece benefícios de assistência médica acessíveis, aumentos anuais garantidos, folga remunerada generosa e um plano de aposentadoria financiado pelo empregador.

Wendell Young, presidente da filial do sindicato, descreveu o contrato em um comunicado de imprensa como uma “grande vitória para o futuro de todos os trabalhadores da indústria da cannabis”.

O CEO da Vireo Health, Kyle Kingsley, também emitiu sua própria declaração e sugere que as empresas de cannabis vejam os sindicatos como parceiros eficazes na defesa da legalização da maconha.

“Nós acreditamos que uma força de trabalho sindicalizada é fundamental para o sucesso de nossa empresa e esperamos fazer parceria com a UFCW para apoiar a legislação, como a legalização da cannabis para adultos, que ajudará a criar milhares de novos empregos de classe média em todo o Estado de Keystone*”, ele escreveu.

*Estado de Keystone, ou Keystone State, é um apelido dado à Pensilvânia.

Tradução: Joel Rodrigues | Smoke Buddies.

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#PraCegoVer: fotografia (de capa) de um grande pote cônico transparente, contendo flores secas de maconha, sobre uma balança, e, logo atrás, parte do corpo de uma pessoa vestindo camiseta de manga longa preta sob outra de manga curta em cor verde-claro; a foto foi tirada no interior de um dispensário da Califórnia. Foto: Scott Smith | AP.

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