Nova política de drogas de São Paulo foge de polêmicas e destaca prevenção

Fotografia em vista superior de uma pessoa acendendo um cachimbo de crack, mostrando apenas as mãos, sujas de fuligem, e parte do rosto. Drogas.

A Política de Drogas do Estado de São Paulo vem na esteira de novas diretrizes oficiais nas esferas federal e da capital paulista, em que tanto a redução de danos quanto a abstinência poderão ser utilizadas. Com informações da Folha de S.Paulo

Nem internação involuntária, nem redução de danos. A ser instituída nos próximos dias a partir de sanção do governador João Doria (PSDB), a diretriz estadual de São Paulo sobre drogas chama atenção por não utilizar os termos mais frequentes na discussão sobre o tratamento de dependentes químicos.

A omissão é intencional, diz o autor do projeto de lei, o deputado Heni Ozi Cukier (Novo). “Não uso esse linguajar porque não quero polarização, não quero gatilhos ideológicos”, diz o parlamentar, para quem a cartilha não é “nem à direita, nem à esquerda”.

Isso não significa, porém, que os conceitos não estejam presentes. “Estou tentando construir uma saída com o melhor dos dois lados. Não existe nenhuma solução no mundo feita só com um ou com outro.”

A Política sobre Drogas do Estado de São Paulo vem na esteira de novas diretrizes oficiais nas esferas federal municipal (no caso da capital paulista), anunciadas no primeiro semestre.

Entre as formas mais populares de tratamento, redução de danos e abstinência ocupam extremos opostos. Uma é vista como permissiva, a outra como rígida demais.

O debate esquentou no âmbito político-partidário quando Doria sucedeu o petista Fernando Haddad na prefeitura e atacou o problema da cracolândia, no centro de SP.

O tucano desmobilizou o programa municipal Braços Abertos, com base em redução de danos, que dá autonomia ao dependente químico e permite a continuidade do consumo de entorpecentes oferecendo mais segurança —de saúde, social e econômica—, e implementou o programa Redenção.

Na época, em 2017, Doria manobrou para liberar a internação contra a vontade do indivíduo, o que foi visto por críticos como uma política higienista, uma tentativa de se obter carta branca para a remoção forçada dos frequentadores da cracolândia.

A autorização foi barrada na Justiça, mas o tema voltou à baila agora que a Política Nacional sobre Drogas, aprovada no Senado em maio, prevê estímulo ao tratamento baseado em abstinência no lugar da redução de danos.

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A diretriz paulista é uma espécie de modelo híbrido, em que ambas as abordagens poderão ser utilizadas, a depender do caso e da etapa. 

Segundo o psicanalista José Waldemar Turna, supervisor clínico de serviços sociais e saúde mental da cidade de São Paulo, as diferentes formas de tratamento são como “tamanhos de camisa” —servem para alguns e não servem para outros.

Para o coordenador do programa Redenção, Arthur Guerra, o projeto de lei foi feliz ao não eleger um único tema para o tratamento, sob o risco de aparentar superficialidade. “Vejo como uma politica bem genérica.

O nuclear é como esse projeto vai ser executado. Como essa política é colocada na prática para que se façam resultados.”

Guerra afirma que a discussão deve evoluir não apenas entre os governantes, mas entre as ONGs, a sociedade civil e as famílias de usuários. 

“É essencial a conversa. Não adianta chegar na ponta [atendimento] e ter um técnico que não gosta de redução de danos e outro que não gosta de abstinência”, diz.

Para combater o uso abusivo de substâncias ilícitas e os prejuízos em decorrência dela, a nova diretriz estadual prevê sobretudo ações de prevenção, como o estímulo a atividades culturais e práticas esportivas para jovens, como uma forma de afastá-los das drogas. 

“A crise com dependência gera um custo avassalador para o Estado, no SUS. Se você não reeducar as pessoas, não ensiná-las, nosso Estado vai quebrar”, diz o autor do projeto, o primeiro do Novo a ser aprovado em São Paulo.

O deputado Cukier utiliza como exemplo de melhor emprego de verbas públicas um estudo da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) feito em 34 países que apontou que cada U$ 1 gasto em prevenção na área da saúde economiza U$ 4 em tratamento.

A política nacional, que tem como base texto de autoria do ministro da Cidadania, Osmar Terra, firma posição contra a descriminalização das drogas, em especial da maconha. A estadual não entra nessa discussão.

Independentemente disso [ser legal], as pessoas se viciam. E isso tem um custo enorme, com impacto na saúde, na produtividade, nas famílias. Temos que lidar com a dependência, com o uso abusivo. Não estou falando do uso recreativo”, diz Cukier.

No projeto, o deputado estadual sugere ainda a criação de um fundo estadual antidrogas (Funead) para custear os gastos com as políticas de prevenção e tratamento. As verbas seriam oriundas de fontes diversas, que poderiam ir de leilões de bens apreendidos do tráfico a repasses do fundo nacional (Funead).

“O Estado de São Paulo não tem uma política de Estado sobre o assunto, tem política de governo. Cada novo que vem muda. Minha motivação é resolver esse problema”, afirma.

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#PraCegoVer: fotografia (de capa) em vista superior de uma pessoa acendendo um cachimbo de crack, mostrando apenas as mãos, sujas de fuligem, e parte do rosto. Foto: Robson Fernandjes | Estadão.

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