Ministro do STJ pede a MPSP que deixe de atuar como “despachante criminal”

O Ministério Público de São Paulo apelou de uma sentença que havia desclassificado a conduta de tráfico de um homem flagrado com 1,54 grama de cocaína. As informações são da ConJur

O ministro do Superior Tribunal de Justiça Rogerio Schietti Cruz, relator de um habeas corpus na corte, fez um apelo ao Ministério Público de São Paulo para que seus membros deixem de atuar como meros “despachantes criminais”, ocupados de simplesmente pleitear o emprego do rigor penal. Isso por que o órgão ministerial apelou de uma sentença que havia desclassificado a conduta de um homem flagrado com 1,54 grama de cocaína e R$ 64 no bolso.

A denúncia do MPSP pedia a condenação por tráfico de drogas — delito previsto pelo artigo 33 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006) — mas o juízo de piso aplicou o artigo 28, que pune os que portam drogas para consumo próprio, determinando assim mera advertência. O MPSP apelou e, na segunda instância, conseguiu a condenação por tráfico, determinada em quase sete anos de reclusão. Contra essa decisão, houve então a impetração de HC no STJ.

O voto do ministro ressalta que, de fato, nada impede que um portador de 1,54 grama de cocaína possa ser responsabilizado pelo delito de tráfico de drogas. Mas sem a devida investigação e comprovação, não há como concluir que ele estava “disfarçado” de usuário ao vender entorpecentes.

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Nesse contexto, o voto do ministro Schietti repete um apelo ao Ministério Público feito sempre que o órgão consegue condenações desarrazoadas e desproporcionais. Um deles foi feito em setembro de 2021, quando o STJ afastou a condenação de um réu por tráfico pego com 0,4 g de crack e R$ 5.

“Salta aos olhos, ainda, o fato de o Ministério Público haver direcionado seus recursos humanos e materiais — que se imagina não serem tantos, diante da quantidade de casos bem mais graves a investigar e a trazer ao Judiciário — para insurgir-se contra a sentença desclassificatória, que, corretamente, aplicou o princípio do in dubio pro reo”, criticou o ministro.

 

 

 

“Será mesmo, em uma proposta de reflexão institucional, que se considera acertado o caminho trilhado pelo representante ministerial e acatado pela Corte estadual? É sustentável no mundo atual — após uma frustrada guerra cinquentenária ao comércio de drogas — impor-se uma pena de quase sete anos de reclusão, em regime inicial fechado, a alguém flagrado com 1,54 grama de cocaína?”, indaga.

Caso concreto

A fundamentação da decisão do STJ foi no sentido de que, em decorrência da presunção de inocência, não se pode depreender a prática do crime mais grave — tráfico de drogas — tão somente a partir da apreensão de droga em poder do acusado. Ao Ministério Público, cabe comprovar os fatos, mediante o contraditório judicial.

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Assim, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça concedeu a ordem em habeas corpus para cassar o acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo que condenara o réu à pena de quase sete anos de reclusão, por considerá-lo traficante.

O caso aconteceu em Itu (SP), onde o homem foi preso em flagrante e tentou subornar os policiais. Em primeiro grau, foi condenado a dois anos e quatro meses de reclusão por corrupção ativa.

Quanto ao crime de tráfico de drogas, teve a conduta desclassificada para a do artigo 28 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006), que pune os que portam drogas para consumo próprio. O juízo aplicou mera advertência, conforme prevê a lei.

O Ministério Público recorreu e conseguiu, no TJSP, a condenação também por tráfico de drogas, em seis anos, nove meses e 20 dias de reclusão. Com isso, a pena total subiu para nove anos, um mês e 20 dias, em regime inicial fechado.

Para a 6ª Turma do STJ, o tribunal paulista não conseguiu apontar elementos suficientes para concluir pela prática do delito de tráfico de drogas. Embora o réu tenha admitido informalmente o tráfico aos policiais que fizeram a prisão em flagrante, negou o fato em juízo e não foi visto em atividade de traficância.

As condutas imputadas pelo MP foram de “trazer consigo” e “transportar” drogas, que se enquadram tanto no artigo 33 da Lei de Drogas, que pune pelo tráfico, como no artigo 28, destinado ao usuário. E a norma não determina parâmetros seguros de diferenciação entre essas figuras.

“Salvo em casos de quantidades mais expressivas, ou quando afastada peremptoriamente a possibilidade de que a droga seja usada para consumo próprio do agente — e a instância de origem não afastou essa hipótese —, cumpre ao titular da ação penal comprovar, mediante o contraditório judicial, os fatos articulados na inicial acusatória, o que, no entanto, não ocorreu”, afirmou o ministro Rogerio Schietti, relator do HC.

A conclusão no habeas corpus foi acompanhada na 6ª Turma por todos os integrantes. Votaram com o relator os ministros Antonio Saldanha Palheiro, Laurita Vaz e Sebastião Reis Júnior, e o desembargador convocado Olindo Menezes.

HC 705.522

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