Maconha: Droga, remédio ou produto?

Maconha: Droga, remédio ou produto? Smoke Buddies

Afinal a maconha é o que?

Em meio à tantos passos na contra-mão, a discussão sobre a regulamentação da erva está cada vez mais sendo explorada, especialmente por conta de tantos exemplos de sucesso da liberação, como está acontecendo nos EUA e com nossos vizinhos, Uruguai e Chile. Com informações divulgadas pela Carta Capital, dê um tapinha no que tá rolando em torno ao fim da guerra às drogas.

Parece que legalizar não é mais interesse só de quem fuma e que não é só a maconha que está mais verde: os cofres públicos dos EUA também. O cultivo legal da erva, revelam os dados mais recentes do estado do Colorado, o primeiro a autorizar o uso recreativo nos Estados Unidos, pode tornar-se uma nova e interessante fonte de receita, empregos e impostos. Segundo a organização Drug Policy Alliance, de janeiro a julho do ano passado a cadeia produtiva da cannabis gerou mais de 10 mil postos de trabalho e recheou os cofres públicos estaduais com 27 milhões de dólares em tributos. Estima-se que o comércio da droga em todo o país, apesar de não existir uma permissão federal para o plantio e o consumo, tenha movimentado 2,7 bilhões de dólares em 2014.

Ainda no solo do Tio Sam, nos últimos 20 anos, a chamada guerra às drogas consumiu mais de 1 trilhão de dólares, sem ter aumento nos efeitos sobre o consumo. O fim da repressão, calcula o Instituto Cato, levaria a uma economia de 41 bilhões de dólares anuais apenas nos EUA.

Solo Nacional

Já no país do carnaval, as coisas andam um pouquinho (ou MUITO) diferentes. Os benefícios com a legalização ou a regulação ser igualmente substanciais por aqui, a começar pela economia na repressão. Atualmente, 27% dos presos no País respondem pelo crime de tráfico. Sancionada em 2006, a Lei de Drogas produziu um efeito contrário ao desejado e se mostra totalmente ineficaz na luta contra a criminalidade. Desde a sua entrada em vigor, o número de detentos por comércio ilegal saltou de 31 mil para 164 mil, aumento de 520%. O motivo, aponta a Secretaria Nacional de Drogas, está na distinção entre usuário e traficante e você vai entender o porquê.

Brasil, um país de poucos:

Acontece que por aqui, ao contrário de outros países, o critério adotado para aplicar a lei é subjetivo e leva em conta a quantidade de droga apreendida, o local, as circunstâncias sociais e pessoais do detido e seus antecedentes criminais – isso é: classe social e cor da pele. Essa falta de padrão, cria situações como a condenação a quatro anos e dois meses de detenção por tráfico de drogas de um suspeito que carregava 1 grama e meio de maconha, ou até menos. Não são poucos os depoimentos de jovens que, durante o enquadro, sofreram ameaças dos policiais do tipo “Estou com uma grande quantidade no carro sem dono e louco para fichar alguém”, como conta João Álvares, de 22 anos. “Estava com dois amigos numa praça fumando um quando reparamos a presença de um carro da Polícia Civil. Antes mesmo da abordagem, tiros para o alto foram disparados e gritos ‘todo mundo deita no chão!”. Dos dois, era o único que não era negro e, como esperado, o tratamento comigo foi diferente. Os dois policiais, conversando entre si, comentaram de colocar a barra de maconha que tinham na viatura como sendo B.O. dos dois. Quando terminaram a humilhação, afirmaram que demos sorte por ser de dia e que se vissem a gente de novo pelas redondezas, o encerramento seria diferente. O pior da história foi sentir tamanha impunidade e não poder fazer nada, sendo tratados com humilhação até o último momento, já que eles mandaram a gente sair correndo da praça. Três trabalhadores e estudantes sendo tratados como bandido por causa de um baseado é do Brasil!”.

Lei falha = dinheiro jogado no lixo:

Tudo que vai volta, e toda a injustiça causada pelas autoridades federais é refletida num grande desperdício de money. Um estudo do International Drug Policy Consortium mostra que, se o critério espanhol, para citar um caso, fosse aplicado no Brasil, 69% dos presos por tráfico de maconha estariam livres. Se a base fosse a legislação norte-americana, o porcentual cairia para 34%. Quando se cruzam as informações do Departamento Nacional Penitenciário com os investimentos em segurança pública, chega-se a um valor aproximado dos gastos anuais com esse tipo de detenção: 1,3 bilhão de reais. Em São Paulo, estado responsável por 35% da população carcerária brasileira, os custos em 2011 chegaram a 885 milhões de reais. Se a Lei de Drogas fosse corretamente aplicada, o governo paulista pouparia 270 milhões anualmente.

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Mais que uma planta, um remédio:

O número de benefícios que o green traz para a saúde já é motivo por si só pra liberar. Apesar de tardar, o uso medicinal da planta tá aterrissando no Brasil. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizou, após forte pressão de uma parcela da sociedade, a importação de canabidiol. Atualmente, 809 pacientes importam legalmente o extrato para tratamento médico.

Ainda assim não é suficiente, pois a importação é uma grande pedra no caminho: Cada frasco custa 75 dólares e auxilia no tratamento de gente como Sofia, de 6 anos. “Ela sofre de epilepsia grave, por isso toma uma dosagem relativamente alta para controlar suas crises de convulsão. Eu preciso de dez vidros por mês para tratá-la, são mais de 2,2 mil reais ”, conta a advogada Margarete de Brito, mãe de Sofia. “São preços só para a classe média e alta.”. Este é mais um exemplo de como o Brasil é para poucos, especialmente para quem tem dinheiro.

Além de atrapalhar quem já foi diagnosticado, a criminalização da maconha no país acarreta outro problema: o atraso nas pesquisas científicas nacionais, como aponta Sidarta Ribeiro, neurocientista e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, dizendo que “A maconha será uma das drogas mais importantes do mundo para o tratamento de doenças, em substituição a substâncias lícitas e medicamentos. Com a criminalização no Brasil, as pesquisas ficam comprometidas e largamos atrasado nessa revolução científica”.

América Latina

Apesar de estarmos bem atrasados nesta questão, parece que outros países ao redor do mundo e também na América Latina são bem mais politizados que o nosso. De olho no mercado de potencial bilionário, 26 países descriminalizaram o uso da maconha nos últimos anos, além dos estados americanos que o legalizaram e do Uruguai que o regulou. Recentemente, o Chile autorizou o plantio em pequenas quantidades. Na contramão dessa tendência.

Indo mais longe ainda, totalmente distante do Brasil, o Uruguai está atento a esse potencial. Segundo Julio Calzada, ex-secretário-geral da Junta Nacional de Drogas e um dos idealizadores da regulação do comércio, o país pretende se tornar um polo de pesquisa. “Existem condições e propostas de empresas e laboratórios químicos e farmacêuticos interessados em investir.” Atualmente existem 2,6 mil “fazendeiros” registrados no país vizinho. Até o fim do ano, 240 farmácias estarão aptas a vender maconha.

Atualmente existem 2,6 mil “fazendeiros” registrados no país vizinho.

Atualmente existem 2,6 mil “fazendeiros” registrados no país vizinho.

Quando comparamos nosso país com países do oriente, sempre fazemos questão de apontar nossa “evolução” diante à deles, mas quando o assunto é a luta pelo fim da guerra às drogas, andamos de mãos dadas com países islâmicos e asiáticos, que resumem sua política à pura e simples repressão, alguns até com a pena de morte para traficantes – como é o caso da Indonésia.

E tudo isso é só mais um exemplo da hipocrisia humana, já que pelo menos 5% da população mundial, calcula a Organização das Nações Unidas, recorre ao submundo para conseguir drogas.

A maconha é a terceira substância psicoativa mais consumida do planeta, com 117 milhões de usuários. Detalhe: apesar de ser a menos prejudicial e nem ser possível comparar aos malefícios de outras drogas, a maconha é a única ilegal entre as três primeiras colocadas. As outras são o álcool e o tabaco e esse é melhor exemplo de como o que precisa ser feito é descriminalizar e regulamentar, pois toda essa questão vai além de fumar um beckzinho na praça. A maconha já salvou vidas e vai continuar salvando, mesmo com as curvas no meio do caminho. A pergunta é: porque não facilitar e prover para o povo uma maconha de qualidade e acesso livre aos benefícios que a plantinha nos traz?

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