Justiça ordena ação policial em fazenda de cannabis para fins medicinais no RJ

Fotografia em ângulo superior de um bud de cannabis em início de formação, circundado por diversas folhas rajadas de marrom, com as outras plantas do cultivo aparecendo ao fundo. Imagem: Tim Foster | Unsplash.

Colaboradores da Apepi relataram que a operação contou com sete viaturas, cerca de 20 policiais portando fuzil e cachorros; segundo advogado da associação, não houve nenhum trabalho de investigação anterior à concessão do mandado de busca e apreensão. Saiba mais na reportagem de Matias Maxx para o UOL

A sede campestre da Apepi (Associação de Apoio à Pesquisa e Pacientes de Cannabis Medicinal), onde é produzido extrato de cannabis para mais de mil pacientes, foi alvo na tarde de hoje de operação policial no município de Miguel Pereira (RJ).

Após recurso do advogado da entidade, a juíza Katylene Collyer Pires de Figueiredo, da Comarca de Miguel Pereira, revogou seu despacho e ordenou às 17h30 a retirada dos policiais da fazenda. Durante a ação, sete colaboradores ficaram incomunicáveis por ao menos duas horas.

 

A ação policial cumpria mandado de busca e apreensão — expedido hoje pela juíza — em crimes de tráfico ilícito e uso indevido de drogas. Katylene justifica na decisão que a ação considera “a necessidade permanente de combate à criminalidade na comarca de Miguel Pereira”.

Segundo a direção da Apepi, os policiais pularam o portão e recolheram os telefones celulares dos sete colaboradores que trabalham lá. Eles conseguiram contudo enviar à direção um vídeo do início da operação, postado no Instagram da associação.

Os colaboradores contaram ao UOL que a operação contou com sete viaturas, cerca de 20 policiais portando fuzil e cachorros. A abordagem foi contudo respeitosa. “Alguns deles voltaram para casa levando material didático nosso. Acho que conseguimos uma conversão aí”, disse um dos cultivadores.

A associação sem fins lucrativos foi fundada em 2014 por mães de crianças com epilepsia, cujo único conforto se dá por meio de remédios à base de cannabis.

O CFM (Conselho Federal de Medicina) e a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) já reconhecem o uso terapêutico da cannabis desde 2015. A Lei 11.343, de 2006, apelidada “Lei de Drogas”, diz que cabe à União autorizar o cultivo de plantas como a cannabis para fins medicinais e científicos. No entanto, esse cultivo segue sem regulação do Ministério da Agricultura, Ministério da Saúde ou Anvisa.

Em razão da ausência de regulação, mais de 250 pacientes e associações têm conseguido salvo-conduto para cultivar maconha com fins medicinais através de ações judiciais.

Dessa forma, a Apepi conseguiu na 4ª Vara Federal do Rio de Janeiro uma liminar em 15 de julho do ano passado e deu início ao cultivo na sede campestre em Miguel Pereira.

No dia 13 de novembro, a liminar da associação foi cassada no TRF-2 (Tribunal Regional Federal da 2ª Região) após recurso da Anvisa.

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“Apesar de a desembargadora relatora Vera Lúcia Lima ter votado a favor de manter a liminar, o desembargador Guilherme Diefenthaeler decidiu revogá-la, e o desembargador Marcelo Pereira da Silva acompanhou seu voto e foi formada a maioria”, disse a entidade em nota na ocasião.

No entanto, segundo o advogado Ladislau Porto, em nenhum momento os desembargadores falaram em busca e apreensão enquanto corria o processo.

Temos uma discussão na Polícia Federal e temos uma apreensão da Polícia Civil argumentando organização criminosa, tomando conta da localidade. E o que de fato verifica-se é que não foi feito nenhum trabalho de investigação anterior à questão da busca e apreensão, faltaram diversos dados em relação a isso.”

Segundo o advogado, a associação foi pega totalmente de surpresa, uma vez que já recorreu da decisão dos desembargadores e o processo está em fase de finalização. “Existe uma discussão na Justiça Federal sobre o assunto. Que investigação é essa?”.

Ladislau entrou com recurso contra a decisão da juíza, explicando que ali não se tratava de tráfico, e sim de um cultivo medicinal com processo sob análise da Justiça Federal. Em seguida, a juíza revogou o despacho e determinou a retirada da polícia do local.

Por volta das 18h, os policiais deixaram o local e devolveram os celulares. O diretor da fazenda e mais um cultivador foram levados à delegacia para cumprir formalidades.

A direção da Apepi, que trabalha na sede do Rio, adiantou viagem já marcada para amanhã (27) a Miguel Pereira. Como parte do processo que corre na Justiça Federal, eles já tinham acordado — em reunião com o comandante da PM local — receber amanhã um major do batalhão local para lhe apresentar o cultivo.

Procuradas pelo UOL, a delegacia de Miguel Pereira e a assessoria de imprensa da Polícia Civil ainda não se manifestaram sobre a ação policial.

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#PraCegoVer: fotografia em ângulo superior de um bud de cannabis em início de formação, circundado por diversas folhas rajadas de marrom, com as outras plantas do cultivo aparecendo ao fundo. Imagem: Tim Foster | Unsplash.

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