Julgamento ético-profissional de médicos que trabalham com cannabis: como funciona?
No ecossistema canábico é comum nos depararmos com julgamentos ético-profissionais de médicos prescritores de cannabis medicinal, seja por eventuais irregularidades encontradas em sites e mídias sociais, seja por divergências entre o entendimento de alguns Conselhos Regionais de Medicina e a Anvisa. Entenda no texto de Fabiana Mascarenhas¹ e Maria Barcelos², da Cannabiz.law
A princípio, é necessário saber que a Anvisa e o Conselho Federal de Medicina são duas instituições independentes, o que quer dizer que elas nem sempre concordam em seus regulamentos e normas. No caso do conselho profissional dos médicos, há ainda normas específicas de cada Estado, que podem embasar os processos éticos de maneira distinta, conforme a localidade de cada caso.
De qualquer forma, a Lei n.º 3.268/1957, que estabelece os Conselhos de Medicina, institui como competência e finalidade dos Conselhos Regionais disciplinar, fiscalizar e julgar a postura ética da atividade profissional médica em todo Brasil. Por mais que esta lei específica não estabeleça os critérios e procedimentos acerca do processo ético-profissional, ela dá autonomia administrativa e financeira aos Conselhos, de forma que eles possam cumprir com suas atribuições sem que haja qualquer vínculo ou intervenção por parte de outras instituições.
Além disso, a atividade médica é regida pelo Código de Ética Médica, que em seu capítulo XIV diz que: “II – Os médicos que cometerem faltas graves previstas neste Código e cuja continuidade do exercício profissional constitua risco de danos irreparáveis ao paciente ou à sociedade poderão ter o exercício profissional suspenso mediante procedimento administrativo específico”. E é justamente sobre esse procedimento administrativo que iremos falar.
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Caso haja alguma denúncia de conduta irregular do médico, primeiro é aberto o processo de sindicância para verificar o que ocorreu, podendo até juntar provas neste momento. Na sindicância são juntadas e analisadas peças das partes envolvidas (como respostas a notificações, por exemplo) e pode haver conciliação ou arquivamento do caso ao final do inquérito. No entanto, se a sindicância não resolver o ocorrido, é instaurado o Processo Ético Profissional no Conselho Regional de Medicina em que a infração ocorreu. Excepcionalmente, para infrações envolvendo atendimento por telemedicina ou delitos relacionados à publicidade médica, o processo será instaurado no CRM onde o médico tiver inscrição primária.
Todo o processo segue a resolução CFM nº 2.306/2022, que institui o Código de Processo Ético profissional, e os procedimentos acontecem como na justiça comum, com acusação, defesa, provas, testemunhas e julgamento. Além disso, todas as fases deste tipo de julgamento são realizadas em sigilo, para preservar a privacidade dos médicos e de pacientes eventualmente envolvidos no caso.
A lei federal 3.268 de 1957, que fala sobre os Conselhos de Medicina, determina que as penas disciplinares aplicáveis aos profissionais são determinadas de acordo com a gravidade da infração ética, podendo ser: (i) advertência confidencial em aviso reservado; (ii) censura confidencial em aviso reservado; (iii) censura pública em publicação oficial; (iv) suspensão do exercício profissional de até 30 (trinta) dias; ou (v) cassação do exercício profissional.
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Após o julgamento, o denunciante ou o denunciado tem até 30 dias para recorrer da decisão e pode ainda solicitar a revisão do processo nos casos em que se descobrirem novas provas que possam modificar a decisão anterior. Se o resultado da revisão for procedente, o Conselho de Medicina poderá anular o Processo Ético-Profissional ou mesmo alterar a decisão para reduzir a pena ou absolver o profissional punido.
Em resumo, os médicos que trabalham com cannabis medicinal podem passar por todo o processo ético-profissional normalmente, caso ocorra alguma infração referente ao exercício da profissão. Nessas situações, o indicado é ficar atento aos prazos e às resoluções específicas de cada estado, com o intuito de resolver a situação logo na sindicância, para evitar o julgamento ético-profissional em si.
Tem interesse em saber mais sobre o assunto? Vamos conversar!
¹Fabiana Mascarenhas – Advogada do Fcmlaw especialista em assessoria jurídica especializada no ecossistema das startups, coordenando projetos da Cannabiz.Law, inovação e empreendedorismo.
²Maria Barcelos – Time Cannabiz.law, iniciativa do Fcmlaw que oferece consultoria jurídica especializada e descomplicada em diversas frentes no setor de cannabis.
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