Indianos contam como é fumar maconha com os pais

Ilustração de dois homens (o da esquerda com barba), do pescoço para cima e em perfil, um olhando para o outro, enquanto o da direita segura cuidadosamente, com os dedos médio e polegar, um cigarro de maconha aceso que passa para o outro; a imagem é em tons de bege, laranja e marrom, com um fundo abstrato.

Os indianos fumam maconha há séculos, mas mesmo assim a erva é uma substância ilegal sob a lei da Índia. O debate sobre a cannabis parece ter evoluído no país, mas e a cultura, evoluiu também? Saiba mais sobre a questão na reportagem da VICE

Se você é um indiano que curte fumar maconha regularmente e não imagina um jeito melhor de encerrar o dia do que com uma bomba, muito provavelmente seus pais não sabem.

Maconha sempre foi uma parte importante da cultura indiana; na verdade, as pessoas fumam a erva há vários séculos. Há até menções sobre maconha em antigas escrituras indianas.

Mesmo assim, cannabis continua sendo uma substância ilegal sob a lei da Índia, apesar de esforços de ativistas que mencionam os benefícios médicos e industriais da planta. Mas mesmo que o diálogo sobre cannabis pareça ter evoluído, ficamos imaginando: a cultura evoluiu também?

A molecada indiana provavelmente tem mais medo de ser pega pelos pais do que pela polícia. Lidar com os velhos quando você está bem louco pode facilmente dar merda. Mas como a VICE descobriu, esse não é o caso pra todo mundo. Então, enquanto a maioria dos jovens se conforma com uma vida de pingar colírio e fingir que não comeu nada o dia inteira para justificar a larica, algumas pessoas estão chapando com os próprios pais.

Mas como esses jovens indianos convenceram os pais a colocar tabus sociais sobre os perigos da “droga” de lado para fumar um com eles? Como eles superaram o constrangimento da situação? E principalmente, essa sessão os aproximou de seus criadores?

Perguntamos tudo isso para algumas pessoas que fumaram maconha com os pais. Aqui vai o que eles tinham a dizer.

“Convenci eles dando informações seletivas, e funcionou”

Já fumei maconha com meus pais três vezes. Foi ideia minha, mas precisei convencê-los. Comecei falando sobre todos os benefícios da erva – que ela pode matar células cancerígenas e ajudar a acalmar a ansiedade, e como ela é menos prejudicial que o álcool. Essa informação seletiva significou que não mencionei fatos como que algumas coisas que você encontra na Índia são batizadas, que fumar ainda fode seu pulmão e que uso pesado pode danificar células cerebrais. O que ajudou bastante foi um colega de faculdade do meu pai, que também fuma, e que disse a eles que beber uma cerveja é pior que fumar um beck. Obrigada, tio, um abraço pro senhor.

Então, numa noite de domingo, bolei um beck de haxixe pra fumar no meu quarto. Como eles nunca fumaram antes, ensinei como tragar direito. Eles tossiram mesmo assim. Depois, diminui as luzes e coloquei uma música, liguei umas luzes coloridas que tenho e assistimos uns vídeos psicodélicos. Em vez de se sentirem constrangidos, meus pais descreveram se sentir com a cabeça leve e relaxados. Meu pai até achou a música mais legal, e os dois experimentaram dilatação do tempo. No final da viagem, meu pai disse que foi ótimo e que podíamos fazer disso uma tradição de domingo. Isso não aconteceu, mas essa vez foi uma boa oportunidade para criar laços, e acho que deixou eles mais relaxados sobre eu fumar desde que não seja com muita frequência. Agora, até meus amigos fumam em casa já que meus pais são os únicos do nosso círculo que não veem problema nisso.

– Kunal*, 22 anos

“Fumei um com meu pai e fui pra aula, aí recebi uma ligação dele em pânico dizendo que estava afundando na cama”

Eu e meu irmão gêmeo fumamos com nosso pai quando tínhamos 17 anos. Na verdade, ele pegou um amigo meu fumando um bong. Pra minha surpresa, apesar dele não gostar de cigarro, dessa vez ele perguntou se podia experimentar. Então, ficamos bem chapados juntos e fazemos isso sempre agora. Todo final de semana fumamos um bong juntos, e isso criou um senso de camaradagem. Temos conversas profundas incríveis, pedimos comida na hora da larica e só relaxamos mesmo. Também sinto que ele ser parte disso ajudou a me sentir mais no controle, e ser mais maduro sobre a coisa toda.

Mas precisei convencer minha mãe. No começo, ela não sabia o que estava acontecendo. Aí, uma vez, meu pai fumou com a gente e eu fui pra aula. No meio do dia, recebi uma ligação dele em pânico; ele achou que estava afundado na cama. Minha mãe achou que ele estava bêbado. Outra vez, eu e meu irmão fizemos brownies de maconha e esquecemos na geladeira. Minha mãe adora um doce, então acabou comendo tudo, desmaiou por 8 horas, depois disse que foi o melhor descanso que ela já teve. Depois disso, ela fumou com a gente algumas vezes, mas ainda não sabe a frequência que a gente fuma.

Pra convencer seus pais, você tem que contar a verdade. Eles podem ficar putos no começo, e provavelmente gritar e até te colocar de castigo. Mas você tem que aceitar, e continuar falando dos aspectos positivos. É sempre melhor que eles saibam.

– Rahul*, 22 anos

Leia: Maconha ajudou a preservar cavernas indianas por 1500 anos

“Meu pai me animou num dia ruim tirando um beck do bolso”

Meu pai costumava fumar com meu irmão, mas nunca fiz parte dessas sessões. Na verdade, minha experiência inicial fumando maconha foi com meus amigos da faculdade. Mas ano passado, numa viagem de férias pra Lavasa, juntei coragem para perguntar pro meu irmão e meu pai se eu podia fumar com eles. Foi muito legal, e agora meu pai e eu fumamos com frequência.

Acho que a vez mais memorável em que fumamos juntos foi quando eu estava com TPM; eu estava tendo um dia péssimo e estourando com todo mundo. Mas quando reclamei nervosa pro meu pai me deixar em paz, ele tirou um beck do bolso e me levou até a varanda. Aquele beck me acalmou totalmente.

Meu pai e eu temos as conversas mais sinceras quando chapamos juntos. Minha mãe sabe que a gente fuma, mas não gosta do cheiro então prefere não participar. Mas ela já experimentou óleos de CBD. Essa experiência me convenceu de que se eles são tão compreensíveis com uma coisa que é tabu, então posso compartilhar qualquer coisa com eles sem medo e sem ser julgada. Mas eles também deixaram claro que isso não pode ser uma coisa diária. Essa atitude de confiar na gente em vez de nos restringir, por sua vez, nos fez ter mais respeito por eles, e nos ajudou a manter o controle. Da parte deles, eles se sentem mais seguros com a gente fumando com amigos, porque viram como a gente age chapado e sabem que não precisam se preocupar com isso. – Neha*, 21 anos

“Acho que a criação dos nossos pais, círculo de amigos e compreensão da substância afeta a visão deles da maconha”

Fumei com meus pais, mas acho que minha mãe gosta mais, enquanto meu pai meio que não traga. Fumamos em família pela primeira vez muito tempo atrás, com minha irmã e meus primos em Nova Orleans. Eu tinha 22 anos e honestamente estava um pouco nervoso em envolver meus pais, já que vinha fumando escondido desde os 18. Mas, pra minha surpresa, eles não viram problema nisso.

Acho que a criação dos nossos pais, círculo de amigos e compreensão da substância afeta a visão deles da maconha. Eles provavelmente são mais liberais porque acompanham o movimento de legalização e sabem que isso é parte da nossa cultura antes dos britânicos estragarem tudo.

Geralmente só fumamos juntos em festas ou outros eventos sociais. Se eles veem um amigo meu bolando um, eles dizem “Mujhe bhi de do (Passa pra mim também)”. Claro, eles não sabem a frequência que fumo; se soubessem, ficariam meio preocupados!

– Siddharth*, 27 anos

“Comi um bolonha com os pais do meu marido e ri incontrolavelmente por horas, o que fez eles perceberem que não era minha primeira vez”

Não fumei com meus pais, mas recentemente fui a uma festa com umas 15 pessoas da família do meu marido, os pais e primos dele. Estávamos acampando numa fazenda em Bengaluru e era aniversário da tia do meu marido. Os primos deles nos chamaram às 7h30 – antes termos a chance de escovar os dentes, usar o banheiro e tomar banho – e nos deram o que depois foi revelado ser bolonha.

Tive uma viagem ótima, mas a tia do meu marido começou a dançar loucamente. Comecei a rir sem parar. O pessoal começou a perceber lentamente que tinha alguma coisa ali. Um tio até começou a acreditar que a cabeça dele estava partida em dois. Enquanto eu ria incontrolavelmente, minha sogra, que não comeu muito, ficou olhando pra mim e notou que eu estava muito confortável na viagem. Eu disse pra eles o que fazer para ter uma boa experiência, então ficou óbvio que não era minha primeira vez. Mas no final das contas, a experiência nos aproximou.

Quando o barato passou, a maior parte dos parentes do meu marido ficou puta, porque não foi uma coisa consensual. Mas no final da viagem, soltei que tinha sido uma das minhas melhores e, juro, meus sogros me deram um sorrisinho maroto.

– Shrishti*, 32 anos

*Os nomes foram mudados para proteger a privacidade dos entrevistados.

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Vídeo reúne experiência de pais fumando maconha pela 1ª vez com seus filhos

#PraCegoVer: a ilustração de capa mostra dois homens (o da esquerda com barba), do pescoço para cima e em perfil, um olhando para o outro, enquanto o da direita segura cuidadosamente, com os dedos médio e polegar, um baseado aceso que passa para o outro; a imagem é em tons de bege, laranja e marrom, com um fundo abstrato. Ilustração: Sadewa Kristianto.

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