Canabidiol Farmanguinhos: Fiocruz recebe aval da Anvisa para produzir produto de cannabis

Fotografia que mostra os dedos de uma pessoa que segura um conta-gotas preto contendo um pouco de óleo e uma gota do mesmo no ar, logo abaixo, além de parte da outra mão e um frasco âmbar, no segundo plano, fora do foco, em fundo verde-oliva. Imagem: Unsplash / Nora Topicals.

Autorização vem na esteira de um acordo de cooperação técnica celebrado em outubro passado entre a Fiocruz e a farmacêutica Prati-Donaduzzi para transferência de tecnologia para a produção de canabidiol

Nessa sexta-feira (14), a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) concedeu autorização sanitária à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), instituição pública ligada ao Ministério da Saúde, para que a entidade produza canabidiol (CBD), segundo publicou a agência no Diário Oficial da União.

O Canabidiol Farmanguinhos, autorizado sob a RDC 327/2019, que criou a categoria “produtos de cannabis”, é uma solução de canabidiol a 200 mg/ml classificada como fitofármaco pela Anvisa, ou seja, um CBD purificado e isolado que contém até 0,2% de THC (tetraidrocanabinol) em sua composição, a ser dispensada em frasco de vidro âmbar de 30 ml.

A autorização sanitária concedida à Fiocruz vem na esteira de um acordo de cooperação técnica celebrado em outubro passado entre a entidade e a farmacêutica paranaense Prati-Donaduzzi, para a “transferência de tecnologia e fornecimento entre outras avenças referente ao produto Canabidiol 200 mg/ml”, que permanecerá em vigor “pelo prazo de 5 (cinco) anos a contar da data da publicação do instrumento específico para o primeiro fornecimento do medicamento ou produto de cannabis, pelo adquirente ao Ministério da Saúde”.

O acordo assinado com a Prati deixa explícito que a Fiocruz tem a intenção de fornecer o canabidiol para o Ministério da Saúde, ou seja, a autorização da Anvisa nesse caso difere dos outros produtos de cannabis autorizados até então pela agência, que são voltados para o abastecimento do mercado farmacêutico.

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Canabidiol no SUS

A Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), órgão ligado ao Ministério da Saúde, realizou uma consulta pública entre os meses de fevereiro e março para receber opiniões sobre a inclusão do Canabidiol Prati-Donaduzzi no SUS para o tratamento de crianças e adolescentes com epilepsia refratária.

O produto que está sendo analisado pela Conitec para inclusão no rol de medicamentos ofertados no SUS é uma versão sintética do canabidiol que, tal como o Canabidiol Farmanguinhos, é apresentada na forma de solução oral com concentração de 200 mg/ml em frasco de 30 ml.

De acordo com o relatório da Conitec que embasou a consulta, as evidências científicas existentes sobre o produto foram consideradas de moderadas a muito baixas, por serem indiretas (as pesquisas encontradas referiam-se a outra população ou intervenção), imprecisas e possuírem risco de viés (quando há erros na forma de condução dos estudos que podem distorcer o resultado).

O relatório também apontou que, considerando o preço com impostos do Canabidiol Prati-Donaduzzi, os cofres públicos seriam onerados em mais de R$ 770 milhões para atender toda a população elegível (pacientes com as síndromes de Lennox-Gastaut e Dravet, com idade entre 2 e 17 anos, e resposta inadequada ou insuficiente aos medicamentos antiepilépticos disponíveis), formada por cerca de 1.000 pacientes ao ano, no período de cinco anos.

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Produtos de cannabis no mercado farmacêutico

Atualmente, existem quatro produtos derivados de cannabis disponíveis nas prateleiras das farmácias do país: um da GW Pharmaceuticals e outros três da Prati-Donaduzzi.

O Mevatyl, fabricado pela GW, tem concentração de 27 mg/ml de THC e 25 mg/ml de CBD, sendo comercializado em frascos spray de 10 ml. O medicamento, primeiro com registro autorizado pela Anvisa, chegou às prateleiras em junho de 2018.

Primeiro produto de cannabis a ser autorizado sob a resolução RDC 327/2019, o Canabidiol da Prati chegou às farmácias em maio de 2020, em frascos de 30 ml com 200 mg/ml de CBD. Em fevereiro, a empresa obteve autorização para a produção de duas novas concentrações do produto, 20 mg/ml e 50 mg/ml.

No último dia 15, a Nunature Distribuição do Brasil recebeu autorização da Anvisa para produzir dois fitofármacos à base de CBD, nas concentrações de 17,18 mg/ml e 34,36 mg/ml.

“A maioria dos produtos é de matéria-prima isolada. São 2.000, 3.000 mg isoladas de canabidiol. Então, ele tem residuais de outros componentes canabinoides, inclusive o THC, a níveis aceitáveis pela legislação. Por mais que a nossa concentração seja ‘baixa’, dentro dos estudos os efeitos terapêuticos são mais eficazes em relação ao isolado nas mesmas concentrações”, explica Jorge Felipe Lara, vice-presidente de Operações no Brasil da Nunature, em entrevista à Exame.

A maior eficácia a que Lara se refere, quando compara o produto da Nunature com o canabidiol isolado, parte do conceito de que a presença de todos os componentes encontrados na planta da cannabis promove uma sinergia entre as moléculas, denominada como efeito comitiva (entourage), que potencializa os benefícios medicinais proporcionados por estas, ou seja, os efeitos terapêuticos dos compostos da maconha são maiores quando os mesmos estão juntos.

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Além das farmácias

As pessoas que necessitam dos produtos de cannabis para seu tratamento de saúde também contam outras duas vias legais de acesso: associações de pacientes e importação.

Associação Brasileira de Apoio Cannabis Esperança (Abrace), sediada em João Pessoa (PB), ainda é a única entidade no país com autorização judicial para o cultivo, extração e venda de produtos à base de cannabis para associados. Os pacientes que recebem prescrição de produtos da Abrace devem se associar para poder adquirir o óleo.

Na Cultive Associação de Cannabis e Saúde, os associados garantiram, por meio de Habeas Corpus coletivo, o direito de cultivar a própria cannabis e produzir extratos artesanais a partir da planta para uso terapêutico. (Decisão proferida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo impede que os responsáveis e membros da associação sejam presos por cultivar, produzir medicamentos ou fornecer mudas de cannabis a seus associados portadores de ordem judicial para tal finalidade.)

Os médicos também podem receitar medicamentos canabinoides importados. Para adquirir produtos de cannabis via importação, o paciente deve, além de ter a prescrição, solicitar autorização da Anvisa.

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#PraCegoVer: fotografia de capa mostra os dedos de uma pessoa que segura um conta-gotas preto contendo um pouco de óleo e uma gota do mesmo no ar, logo abaixo, além de parte da outra mão e um frasco âmbar, no segundo plano, fora do foco, em fundo verde-oliva. Imagem: Unsplash / Nora Topicals.

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