BOLSONARO MANDA COMEMORAR TORTURAS, ASSASSINATOS E DESAPARECIMENTOS DO GOLPE MILITAR

Imagem traz no lado esquerdo a ilustração assinada por Carlos Latuff (2016) em que Jair Bolsonaro é representado de boca aberta, onde dentro dela pode-se ver uma pessoa sendo torturada em um pau de arara; com um fundo cinza-claro. Golpe.

Comemorar o período de trevas que foi a ditadura militar no Brasil é um absurdo. Nossa sorte foi que a população como um todo não alimentou tamanha imprudência, de acordo com o Dr. André Barros, que disserta sobre o assunto em sua coluna desta semana, baseado no programa Fumaça do Bom Direito.

Bolsonaro mandou os quartéis comemorarem um golpe que instaurou uma ditadura de 25 anos no Brasil, esquecendo-se que esta República constitui-se em Estado Democrático de Direito – artigo 1º da Constituição Federal. Durante esse longo período, todas as brasileiras e todos os brasileiros tiveram cassado seu direito político de votar para Presidente do seu país. Bolsonaro praticou crime de responsabilidade, previsto no artigo 85, inciso IV, da Carta Política do Brasil, pois, além de não existir lei para tal despautério, atentou contra a segurança interna do país. Isso porque seu gesto acaba por incitar as Forças Armadas a cometer uma ilegalidade, logo a instituição que tem como atribuição constitucional a defesa do Estado e suas Instituições Democráticas. Deu essa ordem e fugiu para Israel.

Alguns quartéis de fato comemoraram o golpe de Estado de 1964, mas, sabedores das torturas, assassinatos e desaparecimento de pessoas, nossa sorte foi que a população como um todo não alimentou tamanha irresponsabilidade. Seres humanos foram jogados ao mar, em valas de cemitérios clandestinos, ou até incinerados para que a prova material dos crimes fosse destruída. O golpe foi organizado pelo embaixador dos Estados Unidos Lincoln Gordon e pela CIA, dentro da Embaixada Americana no Brasil, financiado por multinacionais e por uma caixinha bilionária alimentada por banqueiros, empresários e apoiadores brasileiros.

É evidente que se trata de um golpe de Estado de natureza militar, pois basta ler o nome dos assinantes do Ato Institucional de 9 de abril de 1964: General Arthur da Costa e Silva, Tenente-Brigadeiro Francisco de Assis Correia de Melo e Vice-Almirante Augusto Hamann Rademeker. Para ter plenos poderes, investiram-se de Poder Constituinte e declararam, nos preâmbulos do Ato Institucional, até então sem número, o seguinte: “Assim, a revolução vitoriosa, como Poder Constituinte, se legitima por si mesma. Ela destitui o governo anterior e tem a capacidade de constituir o novo governo.”

Não existiu qualquer revolução, o golpe contra a nação é claro, mantiveram a Constituição de 1946 e as constituições estaduais, com as modificações dos 11 (onze) artigos do Ato Institucional. Foi um golpe para destituir o Presidente eleito João Goulart, como está claro com todas as letras no preâmbulo já citado, mas que vale repetir: “Ela destitui o governo anterior e tem a capacidade de constituir um novo governo.” No artigo 9º está o grande golpe contra o país: “Art. 9º – A eleição do Presidente e do Vice-Presidente da República, que tomarão posse em 31 de janeiro de 1966, será realizada em 3 de outubro de 1965.” Aí está o grande golpe! Somente 25 anos depois, em 15 de novembro de 1989, ocorreu a eleição seguinte.

O Ato sem número ganhou o nº 1, porque até 14 de outubro de 1969 foram decretados 17 Atos Institucionais, revogados pela Emenda Constitucional nº 11, de 13 de outubro de 1978, que entrou em vigor em 1º de janeiro de 1979.

O mais terrível de todos os atos foi o AI-5, que suspendeu a garantia do habeas corpus, permitindo assim a prisão ilegal de qualquer pessoa ao suspender o remédio heroico da liberdade. O mais terrível ainda viria depois. Em 29 de setembro de 1969, entrou em vigor o Decreto-Lei 898 e o seu sinistro artigo 59:

   “Art. 59. Durante as investigações policiais o indiciado poderá ser preso, pelo Encarregado do Inquérito até trinta dias, comunicando-se a prisão à autoridade judiciária competente. Este prazo poderá ser prorrogado uma vez, mediante solicitação fundamentada do Encarregado do Inquérito à autoridade que o nomeou.

   § 1º O Encarregado do Inquérito poderá manter incomunicável o indiciado até dez dias, desde que a medida se torne necessária às averiguações policiais militares.”

Com esse artigo 59, uma pessoa poderia ser presa por qualquer agente da polícia, sem que estivesse praticando um crime e sem ordem judicial.  Na realidade, deixava a mesma sem comunicação com a sua família e advogado em inquéritos secretos por 60 dias. Milhares de pessoas foram torturadas com a suspensão do habeas corpus combinado com o Decreto-Lei 898, muitas foram mortas no que os torturadores chamavam de “acidente de trabalho”. Dentre os milhares de torturados, havia guerrilheiros e pessoas sem qualquer envolvimento. Desapareciam com os corpos das pessoas assassinadas sob tortura. Era assim que agiam contra as pessoas que não concordavam com a ditadura e toda a sua barbárie. Os atos institucionais, especificamente o AI-5 e o Decreto-Lei 898, são provas cabais de que as torturas, assassinatos e desaparecimentos eram políticas de Estado do regime civil-militar instaurado pelo Golpe Militar de 1964.

Por que os arquivos ultrassecretos, trancados a sete chaves pela Lei 12527, de 18 de novembro de 2011, não são abertos? Apresente ao país os arquivos do DOPS, DOI-CODI, CENIMAR, mostre as atrocidades cometidas em nome dos militares e dentro de repartições militares e da polícia. A grande maioria dos militares e do povo brasileiro jamais irá aprovar as atrocidades praticadas nos porões da ditadura. Já que Bolsonaro se orgulha tanto do golpe militar de 1º de abril de 1964, ele deveria abrir os arquivos da ditadura!

Assista abaixo a edição do programa Fumaça do Bom Direito:

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#PraCegoVer: imagem de capa traz no lado esquerdo a ilustração assinada por Carlos Latuff (2016) em que Jair Bolsonaro é representado de boca aberta, onde dentro dela pode-se ver uma pessoa sendo torturada em um pau de arara; com um fundo cinza-claro.

Sobre André Barros

ANDRÉ BARROS é advogado da Marcha da Maconha, mestre em Ciências Penais, vice-presidente da Comissão de Direitos Sociais e Interlocução Sociopopular da Ordem dos Advogados do Brasil e membro do Instituto dos Advogados Brasileiros
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