Com armas e agrotóxicos liberados, por que a cannabis segue proibida?

Foto de uma placa fincada na areia da praia, próxima a uma canga cor de rosa, estendida sobre o chão, com os dizeres "Sem vítima, sem crime!", e desenhos da flor de cannabis. Foto: Dave Coutinho saúde

Em nome da saúde e da segurança da sociedade, a maconha segue proibida, enquanto armas e agrotóxicos vão sendo liberados. Qual o problema de uma pessoa ter, por direito à sua liberdade e segurança, alguns pés em casa?

Se você questionar a razão da manutenção da proibição da maconha e de outras drogas a qualquer pessoa com ideologia proibicionista, a resposta provavelmente será: para preservar a saúde e segurança da sociedade.

Em pleno 2022, esta e outras justificativas, como as utópicas ideias de que proibir, com repressão e leis severas, reduziria a produção e comercialização ilícita junto com o consumo, ou de que com a regulamentação todos sucumbiriam ao vício, tornando-se dependentes e superlotando o sistema de saúde, ou ainda de que famílias seriam destruídas por conta do uso de maconha ou outras substâncias, deixaram de serem motivos coerentes, e com a atual gestão bolsonarista, é nosso dever, e dos mais esclarecidos no tema, derrotar de uma vez por todas falsas argumentações sobre o assunto.

Será mesmo que o Brasil não está preparado para a regulamentação da maconha? Com armas e agrotóxicos sendo liberados, destruindo cada vez mais nossa existência, o real motivo da proibição fica claro que é qualquer outro, nem um pouco ligado à saúde e segurança.

ARMAS OU MACONHA?

O governo Bolsonaro publicou mais de 30 decretos e atos normativos desde janeiro de 2019 para facilitar o acesso às armas. Embora muitos estejam judicializados, a intenção de aumentar o acesso ao armamento foi atingida.

As famigeradas canetadas dadas por Jair Messias Bolsonaro, o Presidente da República, para flexibilizar as regras e favorecer o armamento da população têm resultado, junto a falhas na fiscalização, numa desenfreada crescente dos crimes cometidos com armas de fogo e cada vez mais operações na tentativa de desmantelar o fornecimento de armamentos e munições para o crime organizado, que foram adquiridas por vias legais.

De acordo com a reportagem do portal Brasil de Fato, um levantamento realizado pelo advogado e gerente do Instituto Sou da Paz, Bruno Langeani, aponta que o número de armas em circulação na categoria Caçador, Atirador Esportivo e Colecionador (CAC) no Brasil já é superior ao total de armas da instituição Polícia Militar. Os dados fazem parte do seu mais recente livro Arma de Fogo: Gatilho da violência no Brasil, da editora Telha.

Segundo os dados obtidos pelo autor a partir do Sistema Nacional de Armas (Sinarm) e do Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (SIGMA), até abril de 2021, os CACs contabilizavam um total de 648.731 armas, enquanto a soma dos armamentos das Polícias Militares totalizava 583.498.

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Na pátria amada Brasil, os cidadãos “de bem”, que costumam criminalizar a cultura, a distribuição e os usos da maconha, são os mesmos que endossam as famigeradas canetadas que estão causando muito mais danos do que se cada um dos 212,6 milhões de brasileiros cultivasse 6 pés de maconha em casa.

Leia também: O que traz mais risco à sociedade: 4 armas ou 4 pés de maconha em casa?

Se em nome da liberdade e segurança do cidadão, temos tais flexibilizações para gerar uma verdadeira corrida armamentista. Qual seria o problema de uma pessoa ter, por direito à sua liberdade e segurança, alguns pés de maconha, seja lá qual for o uso, do decorativo ao adulto, tal como as armas de fogo, mas sem trazer riscos de morte aos vizinhos, familiares e sociedade?

Dois pontos a ressaltar em comparação às armas. O primeiro é que a maconha, por si, nunca matará diretamente alguém, nem quem a consome e muito menos quem nunca consumiu. Já o segundo é para derrotar a argumentação de que “se legalizar o consumo vai aumentar”: não vai, e não vai ocorrer uma busca desenfreada por maconha. No máximo, o que ocorrerá é que com a regulamentação e taxação de impostos saberemos o real número de consumidores de cannabis no país, e o consumidor ao menos estará acessando o produto por vias legais e seguras.

Não sei você, mas eu prefiro viver numa sociedade infestada de maconha do que com armas. Reflita!

AGROTÓXICO TUDO BEM, MAS É A MACONHA QUE FAZ MAL À SAÚDE

Aprovado recentemente na Câmara, rapidamente e com 301 votos favoráveis e 150 contrários entre os deputados, o projeto que flexibiliza a liberação e comercialização de agrotóxicos pretende tornar o veneno cada vez mais presente na alimentação da população. Retornando ao Senado, onde começou a tramitar em 2002, a proposta não deve encontrar a mesma facilidade por lá.

Caso seja aprovado entre os senadores, o PL dos Agrotóxicos prevê que o Ministério da Agricultura passa a ter um poder de decisão maior sobre registros de novos agrotóxicos. Hoje, além da Agricultura, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) também decidem sobre agrotóxicos.

Caso a proposta se torne lei, Anvisa e Ibama deixam de ter poder de decisão. Logo a Anvisa, que é tão controladora com tudo relacionado à maconha. A “Lei do Alimento Mais Seguro”, assim nomeada por parlamentares favoráveis ao projeto, é chamada pelos críticos de “PL do Veneno”.

Em 2021, o ritmo de liberação de agrotóxicos no Brasil bateu recorde, chegando a 499 registros. A aceitação de novos produtos vem crescendo desde 2017. Ambientalistas temem que novas flexibilizações na lei aumentem o risco de enfermidades provocadas por agrotóxicos, como câncer, doenças neurológicas e até casos de nascimento de crianças com malformações.

Se de um lado temos a flexibilização das leis para armas que provocam uma corrida armamentista, além de municiar a criminalidade direta e indiretamente, e do outro, o PL do Veneno propõem a flexibilização para liberação de agrotóxicos, o que aumentará o risco de enfermidades à população, fica claro o quão irracional é a proibição da cannabis e outras drogas.

Afinal, se os três poderes, sem excluir nenhum deles, estivessem realmente tão preocupados com a saúde, segurança e liberdade da população, a prioridade deveria ser a regulamentação da maconha no Brasil. Já que, tendo em vista tudo o que já explanamos por aqui nos mais de 11 anos dedicados ao assunto, nunca relatamos danos próximos aos causados pelas flexibilizações das armas e agrotóxicos – a não ser os danos da própria proibição, é claro.

Se não é por nossa “saúde e segurança”, qual será o real motivo ($$$$) da proibição? Deixe sua opinião abaixo.

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#PraTodosVerem: Foto de uma placa fincada na areia da praia, próxima a uma canga cor de rosa, estendida sobre a areia, com os dizeres “Sem vítima, sem crime!”, e desenhos da flor de cannabis. Foto: Dave Coutinho.

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Sobre Dave Coutinho

Carioca, Maconheiro, Ativista na Luta pela Legalização da Maconha e outras causas. CEO "faz-tudo" e Co-fundador da Smoke Buddies, um projeto que começou em 2011 e para o qual, desde então, tenho me dedicado exclusivamente.
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