A maconha e a família — por Walcyr Carrasco

Fotografia de Walcyr Carrasco posando de braços cruzados e sorridente, à frente de um back drop com o nome da "Êta Mundo Bom!" em tons claros de azul. Crédito: TV Globo.

Já passou da hora de liberar o uso da cannabis e de não vê-la mais como vilã, é o que opina o escritor, jornalista, dramaturgo e autor de telenovelas Walcyr Carrasco, em sua coluna na revista Veja

Cresci aprendendo que maconha é coisa do demônio. Duvido que entre suas múltiplas atividades o capeta tenha também a de agricultor. Nos últimos tempos está havendo uma virada. Inclusive no Brasil. Recentemente, em junho, uma comissão especial da Câmara dos Deputados tomou decisão favorável ao seu cultivo para uso medicinal. Antes de ser enviado ao Senado, o projeto ainda é passível de recurso para análise na própria Câmara. Mesmo que passe pelo Senado, haverá muitas restrições. É claro que, com o tempo, cairão. Está sendo assim em outros países, como os Estados Unidos, onde alguns estados aprovam até o uso recreativo.

Eu posso falar tranquilamente, porque não sou usuário. Não tenho interesse pessoal na aprovação. Mas desde muito novo eu vejo gente fumando maconha. Nunca vi ninguém pirar, destruir a vida, por causa da cannabis. Mais ainda, agora existe, inclusive, uma associação de mães lutando a favor, pois o canabidiol é a base de um remédio certeiro para a convulsão infantil. Se faz bem, é útil, por que não cultivar? Países como o Uruguai e a Holanda não estão em ruínas por permitirem o consumo. Não gosto de fazer comparações na linha do menos pior. Mas num mundo em que o álcool é permitido, e em que se usam remédios como o Rivotril abundantemente, qual o problema? Sou inteiramente a favor do uso medicinal da maconha. E também do recreativo.

“Num mundo em que o álcool e remédios como Rivrotil são permitidos, qual o problema? Sou a favor da cannabis”

Já tive casa no Litoral Norte de São Paulo. A molecada fumava abertamente na praia, perto de policiais que não estavam nem aí. Já senti cheiro nas ruas de São Paulo. Existem traficantes que fazem delivery. Fato: a lei funciona de um jeito para o pobre e de outro para o rico. Se o garoto de classe média é pego, é só uma passagem pela delegacia. O pobre apanha, leva tiro, é acusado de tráfico.

Óbvio, do jeito que está, o usuário se envolve com a marginalidade. É o único jeito de comprar. E com isso alimenta a poderosa cadeia do tráfico. Mas não é culpa do produto em si, e sim dos canais de venda. Também existem os riscos de intoxicação, já que a droga é misturada (“malhada”) para render mais. E isso tudo é consequência da proibição.

Às vezes, tenho a impressão de que somos governados por um bando de antigas diretoras de colégios internos, corocas e mal-humoradas. Para quem qualquer felicidadezinha já irrita. Uso recreativo? Não. Se diverte, não pode. Se é prazer, é recreativo, é do mal (incluindo sexo). Os mais radicais vociferam contra em nome da família brasileira, coitadinha. Eu só não entendo por que a maconha, em si, pode destruir a família. Pelo contrário, estou certo de que a cannabis já uniu muitos casais que se divertiram na fumaça. Fico pensando que família é essa, coitadinha. De que sempre falam, sempre tão ameaçada. Torço para que a Câmara e depois o Senado aprovem o cultivo para fins medicinais. E todos os tipos de fins.

Pela família, não tenho medo nenhum. Vocês não deviam ter também. O que destrói uma família não é nem nunca foi a cannabis. Mas a falta de amor.

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Artigo publicado em VEJA de 14 de Julho de 2021, edição nº2746

#PraTodosVerem: em destaque, fotografia de Walcyr Carrasco posando de braços cruzados e sorridente, à frente de um back drop com o nome da “Êta Mundo Bom!” em tons claros de azul. Crédito: TV Globo.

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