RAFAEL BRAGA E 2013

O racismo nunca deixou de existir no Brasil, principalmente por parte de nossos governantes e leis que condenam e assassinam, com expressa parcialidade, a negros e pobres todos os dias. Esta segregação, que foi reafirmada na proibição da liamba trazida pelos negros da África, agora tem seu bode expiatório em Rafael Braga, condenado à prisão mesmo em provas.

Em junho de 2013, ocorreram manifestações monumentais no Rio de Janeiro, sendo que duas delas ficaram para a história: a de 100 mil pessoas, na avenida Rio Branco, e a de 1 milhão, na avenida Presidente Vargas. De todas as pessoas reprimidas, uma está presa há quatro anos: um jovem negro e pobre.

Primeiro, Rafael Braga foi condenado por portar um suposto “explosivo” – uma garrafa plástica de Pinho Sol que não possui propriedade explosiva. Depois, foi condenado a 11 anos e 3 meses de prisão por tráfico de drogas e associação ao tráfico. Rafael sequer participou da manifestação de 1 milhão. Naquele dia, ao contrário de prender, como nas demais manifestações, a polícia atacava pessoas que acabaram sitiadas em bares, na Faculdade Nacional de Direito e no IFCS (UFRJ). Nós, advogados, fomos chamados para libertar pessoas apavoradas, acuadas dentro do Amarelinho da Cinelândia. O único preso nesta noite histórica foi Rafael Braga. Inicialmente, havia uma suspeita de um pequeno delito, porém, inexplicavelmente, o flagrante acabou virando “porte de material explosivo”.

Após cumprir longo período pela condenação pelo Pinho Sol, Rafael foi colocado em liberdade, sob monitoramento por tornozeleira eletrônica. Nesse período, certo dia, próximo à sua casa, foi preso por tráfico de drogas. Os policiais disseram que Rafael estava portando 9 gramas de cocaína e 6 decigramas de maconha, além de um morteiro. Mesmo depois de ter trazido testemunhas que desmentiam os fatos da acusação, tudo aquilo foi colocado na conta do Rafael, condenado a uma pena de 11 anos e 3 meses de reclusão apenas com os depoimentos dos policiais. É de se registrar que a quantidade de cocaína e maconha apreendida não é prova material e da existência do crime de tráfico de drogas.

Seus competentes advogados lutam para reformar essa decisão, mas não conseguem. Sofrem críticas injustas. A condenação de Rafael é tratada como um fato isolado, mas, infelizmente, não foge à regra. Ontem (18/07/2017), em debate sobre o caso promovido pelo Coletivo 22, no Ganjah/Lapa, uma pessoa relatou ter sido condenada a 12 anos de cadeia em circunstâncias semelhantes, afirmando que 90 % dos presos são negros e pobres. Essa realidade do nosso sistema já havia sido apontada por Nelson Hungria nos idos anos 1940 em seus consagrados “Comentários ao Código Penal”. O caso de Rafael é emblemático para denunciar um sistema penal historicamente racista, que praticamente só condena a penas pesadas por tráfico jovens negros e pobres, sozinhos, desarmados, sem dinheiro e com pequena quantidade de droga.

Uma grande campanha de arrecadação está em andamento, pois Rafael e sua família precisam comprar uma casa em outro local para que ele não seja preso novamente.

A luta pela liberdade de Rafael Braga virou uma questão de honra para muitas pessoas e vários coletivos que tomaram as ruas em 2013.

Revisão Marta Bonimond
Foto de Capa @Alobiela via Coletivo 22

Sobre André Barros

ANDRÉ BARROS é advogado da Marcha da Maconha, mestre em Ciências Penais, vice-presidente da Comissão de Direitos Sociais e Interlocução Sociopopular da Ordem dos Advogados do Brasil e membro do Instituto dos Advogados Brasileiros
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