PLANTA NA MENTE É UMA CRIANÇA DE 6 ANOS
As ruas do Rio de Janeiro receberam neste carnaval mais um desfile do sensacional bloco canábico Planta na Mente. E, no meio dos batuques e das marchinhas, e entre mais de 20 mil pessoas, uma grande surpresa para o advogado e ativista André Barros. Quer saber qual? Leia o texto abaixo e descubra.
O Planta na Mente fez, pelo sexto ano consecutivo, um desfile sensacional. Depois deste ano, com milhares de pessoas cantando pela legalização da maconha no Brasil, o bloco está no calendário do carnaval da cidade. E transformou, definitivamente, em brasas, a quarta-feira de cinzas.
Assumidamente, é a festa da causa, pois está em sua raiz a defesa da legalização da maconha no Rio de Janeiro, no Brasil e no mundo. Denuncia durante seu desfile que a guerra às drogas é uma farsa, que na realidade é a guerra aos negros, pobres e moradores dos bairros sem saneamento básico, de maneira discriminatória chamados de favela.
O efetivo policial destacado foi totalmente desnecessário. Ao contrário do que se passa em muitos blocos, não houve nenhuma briga, furto ou confusão na multidão do Planta na Mente, que saiu dos Arcos da Lapa, cruzou a rua do Lavradio, passou em frente ao teatro Carlos Gomes e terminou na histórica Praça Tiradentes. Infelizmente, os únicos fatos que destoaram da paz no desfile foram as abordagens aos jovens, sem qualquer motivação, no final do bloco por policiais militares, que, inclusive, já se encaminhavam para o ônibus da PM, que os levariam para seus lares. Apenas uma desnecessária demonstração de poder.
Batuquei do início ao fim, com apenas uma breve saída para o mictório público, que só funcionou para os homens. O banheiro das mulheres estava fechado, em claro desdém de uma Prefeitura porco chauvinista.
Já no finalzinho, tive uma grata surpresa. Uma criança linda, mas descalça e apenas de cueca, pediu para tocar minha caixa. Emprestei as duas baquetas esperando que dali saísse apenas barulho. O menino, negro, forte e com um sorriso maravilhoso, começou a batucar, com as duas baquetas, no compasso da bateria do Planta na Mente. O ritmo estava na sua alma, na sua descendência, no seu sangue e na cor. Perguntei seu nome e sua idade. Ele respondeu que se chamava João Vitor e que tinha apenas 6 anos, a mesma idade do Planta na Mente. Segurei o instrumento com meu talabarte e o levei para o meio da bateria. Aquelas mãozinhas batucaram forte e no ritmo, chamando a atenção de todos ao redor.
Resolvi então doar meu instrumento para aquela criança linda. Ele olhou para mim e perguntou: “você está me dando?”. Confirmei, e a alegria dele foi demais para mim. Saiu feliz com seu novo brinquedo musical. Logo em seguida, veio a sua avó, que me perguntou se eu tinha dado para ele aquela caixa. Disse que sim e parabenizei a avó pelo neto talentoso.
Aquela criança negra já nascia punida por essa nossa terrível sociedade racista. Ele já é uma criança sofrida, que arriscou ao pedir para um homem branco de cabelos brancos para apenas dar uma tocada no meio de uma bateria. Uma criança já cheia de cautela, pois sem dúvida já apanhou muito. Fiquei feliz por ter presenteado um músico nato. Mas fiquei mais indignado, revoltado e triste, pois vivemos numa cidade que teve a maior população escrava do mundo e nada mudou, pelo contrário é mais racista. Aquela criança negra ainda vai apanhar muito pelas ruas dessa cidade de raízes monarquistas e escravocratas. E de uma elite branca e privilegiada que, como eu, mora nas ditas partes nobres da cidade como se vivêssemos numa monarquia, e ainda exige segurança. Pense nisso e Planta na Mente esta ideia na cabeça.
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