Olimpíadas das Drogas e o Estado de Direito
Tráfico de drogas e terrorismo como inimigos #1 do estado: assim é a cobertura midiática das problemáticas relacionadas aos Jogos Olímpicos que vão ocorrer em breve no Rio de Janeiro. Entenda como o problema vai muito além de canos vazando água na Vila Olímpica.
Nos últimos dias, com a aproximação dos Jogos na Cidade do Rio de Janeiro, uma série de fatos chamaram a atenção da mídia. Foram manchetes envolvendo apreensões de papelotes de drogas com símbolos dos jogos, e até prisões de supostos terroristas.
O que nos chama atenção é a indústria do encarceramento, uma mídia comprometida com o cárcere e com a propagação do medo. E centenas de milhares de reais empenhados no setor de segurança para financiar operações pirotécnicas e midiáticas.
Nesse bojo, cabe para além de toda crítica já feita pelos movimentos sociais a respeito dos Jogos e tudo que lhe envolve, podemos problematizar ainda mais o que está acontecendo com o Direito Penal nesse verdadeiro circo montado.
Quero abordar a inconstitucionalidade do crime de tráfico de drogas, e também fazer um elo entre a repressão a esse “inimigo” antigo ao novo “inimigo” que surge, o terrorismo.
Para entender o porquê de ser inconstitucional o crime de tráfico de drogas é simples: a lei de drogas é uma lei penal em branco, ou seja, requer um complemento para definir o que é droga. Pois a lei não diz o que é droga, ela pede que seja complementada para definir quais substâncias serão proibidas.
Até aí tudo bem. Porém, tal lei é uma lei federal, lei penal, que requer aprovação no Congresso Nacional, sanção presidencial e publicação para que tenha vigência. Ou seja, não é simples impor uma lei penal para que a população se submeta a ela. No entanto, o documento que complementa essa lei, é uma decisão de um único homem, uma portaria da ANVISA, cujo Secretário tem o poder de editar.
Percebe o problema? Enquanto que para criar uma Lei Penal foi preciso que Deputados e Senadores trabalhassem no Congresso Nacional e o Presidente da República sancionasse para que tivesse vigência, a norma que complementa essa lei e que no fim vai dá validade e eficácia ao determinar as substâncias que serão proibidas, vêm da decisão autoritária do Secretário da Agência de Vigilância Sanitária. É o que no direito se chama de norma penal em branco heterogênea. E portanto, completamente autoritária e inconstitucional. Pois, o principal conteúdo incriminador está nas mãos não dos representantes eleitos pelo povo, mas sim de uma pessoa colocada por indicação política.
E agora surge o novo inimigo, o terrorismo, algo nunca pensado em nossa sociedade. Essas pessoas estão sendo tratadas como os nossos antigos inimigos, os traficantes, estão sendo privados de liberdade e com um rigoroso tratamento de segurança, seus advogados reclamam de dificuldades para o exercício da profissão, e o Ministro do Justiça vem em público dizer que suas prisões são para servir de exemplo, como se fosse juridicamente possível prender para dar exemplo.
Assim, os jogos olímpicos acabaram de fazer um novo paralelo entre tráfico e terrorismo, na medida que colocou ambos na categoria de inimigos da sociedade de forma autoritária e representados pelo Jogos Olímpicos.
Essa nova guerra não é nossa. O terrorismo é apenas uma das armadilhas que o estado se vale para fortalecer seu potencial de controle e repressão sobre os indivíduos.
Apesar de concordar que as ações do ISIS são de extremo repúdio, não podemos autorizar ações midiáticas e pouco transparentes à título de combate ao terror ainda mais quando não se dá voz às defesas e aos defensores desses indivíduos. É o Direito Penal a serviço do Medo, e isso já passou da hora de acabar, seja na política de drogas seja em qualquer área da segurança pública!
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