O THC E O HC DE LULA

Foto, em vista diagonal, de um martelo de juiz sobre sua base, ambos de madeira, sobre uma superfície também de madeira, junto a uma porção de buds de maconha (cannabis).

A prisão em segunda instância do ex-presidente Lula nos remete à situação de milhares de pessoas que são encarceradas todos os anos devido a uma guerra racista e higienista que condena jovens negros e pobres por poucos gramas de maconha e deixa livres os milionários traficantes donos de aviões e helicópteros. Entenda mais sobre o assunto no texto do advogado e ativista André Barros.

O habeas corpus impetrado a favor de Lula não interessa somente ao Lula, mas a milhares de maconheiros, maconheiras e vítimas dessa guerra racista e classista contra a planta da paz. No caso, o paciente em questão é um ex-presidente do Brasil eleito e reeleito em dois turnos pelo voto direto de milhões de brasileiros, que deixou o cargo com uma aprovação de 80 % e hoje lidera as pesquisas eleitorais.

A Constituição do Brasil estabelece que alguém só pode ser considerado culpado após o trânsito em julgado de uma sentença penal condenatória, ou seja, quando não cabe mais qualquer recurso. A Constituição prevê também a prisão processual por garantia da ordem pública, da instrução criminal, quando o réu está coagindo testemunhas ou da aplicação da lei penal, quando ameaça fugir do local do julgamento.

Milhares de consumidores, escravos do tráfico e plantadores de maconha estão na mesma condição do ex-presidente. Sua condenação em segunda instância, por três desembargadores, vai levar milhões de processados por tráfico de drogas à cadeia. Quase 70% das mulheres presas foram condenadas por tráfico de drogas, flagradas tentando entrar na cadeia com menos de 100 gramas de maconha. Mães que fizeram isso para salvar seus filhos ameaçados de morte.

Milhares de condenados ou processados por tráfico de drogas foram flagrados com menos de 50 gramas de maconha, sozinhos e desarmados, sem o suposto comprador. Quase todas as condenações foram baseadas apenas nos depoimentos de policiais militares. Muitos foram absolvidos pelo juiz de primeira instância, que colheu todas as provas, ouviu as testemunhas e não entendeu que o réu era culpado. Dessas decisões, o Ministério Público recorre de quase todas e muitas sentenças são reformadas pela segunda instância, em condenação acima de 10 anos de cadeia em regime fechado.

O Brasil já possui a terceira maior população carcerária do mundo, com 700 mil pessoas, sendo a grande maioria delas por tráfico de drogas. Nenhum milionário está preso por tráfico de drogas, tampouco algum banqueiro está preso por lavagem de bilhões de dólares do tráfico no mercado financeiro. Nenhum preso por tráfico no Brasil possui avião ou helicóptero.

A condenação de Lula foi a jato, pois o verdadeiro interesse era criminalizá-lo antes da eleição, a fim de impedir sua candidatura. Da mesma forma que na prisão, o impedimento da sua candidatura não interessa somente ao ex-presidente. Mais uma vez, milhões de brasileiros não vão poder votar em quem gostariam que fosse seu presidente, da mesma forma tivemos nossos direitos políticos cassados durante 25 anos quando não podíamos votar para presidente durante a ditadura militar.

Impedir a candidatura do líder das pesquisas é uma afronta à cidadania, ao pluralismo político, ao pluripartidarismo, à soberania popular e ao sufrágio universal. Uma violação ao fundamento da República, onde diz no parágrafo único do primeiro artigo da Constituição que “todo poder emana do povo”.

Revisão Marta Bonimond

#PraCegoVer: Fotografia de um martelo de juiz ao lado de flores de maconha.

Sobre André Barros

ANDRÉ BARROS é advogado da Marcha da Maconha, mestre em Ciências Penais, vice-presidente da Comissão de Direitos Sociais e Interlocução Sociopopular da Ordem dos Advogados do Brasil e membro do Instituto dos Advogados Brasileiros
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