Marcha da Maconha Brasília: repressão agressiva e desnecessária da polícia
O ato aconteceu no dia 28 de maio e registrou um enorme número de revistas abusivas e cerca de 40 prisões na operação chamada “Tolerância Zero”. A capital federal, que deveria dar o bom exemplo, reprimiu seus cidadãos. Saiba mais sobre o que aconteceu abaixo.
Após São Paulo receber um maconhaço com mais de 40 mil pessoas, duas semanas depois um forte contingente armado da Polícia Militar criminalizava a concentração do ato no Distrito Federal.
Na mesma Esplanada dos Ministérios onde fica o STF, a polícia militar do Distrito Federal mobilizou mais de 100 agentes portando metralhadoras e que, com ajuda de cães, agiram de forma arbitraria revistando todos os presentes com uso abusivo e intimidatório da força – lendo até as conversas nos celulares.
A operação chamada “Tolerância Zero” começou por volta das 14h, quando os manifestantes chegavam ao ato. Os detidos foram levados sob as alegações de consumo de maconha, por porte de triturador, seda e flyer do ato, itens completamente lícitos. Entre os detidos a maioria eram negros e mulheres.
Ações como a da PM do DF, que além de arbitrária e violenta, acabam custando muito aos cofres públicos e são completamente desnecessárias, já deveriam ter sido eliminadas de todo e qualquer comando. Afinal, desde que o Supremo Tribunal Federal decidiu de forma unânime dar legalidade a Marcha da Maconha, garantindo os Direitos de Liberdade de Expressão e Manifestação, o único dever da polícia é garantir a segurança dos manifestantes e não coagi-los. Apesar da ação policial, a Marcha em Brasília não foi interrompida, contando com cerca de 8 mil manifestantes.
Com atos como a da PM e com um governo retrógrado, o Brasil segue caminhando na contra-mão dos avanços e mudanças nas políticas de drogas em todo o mundo. A proibição não previne o uso, tão pouco educa a população e estigmatiza o usuário, enquanto o tráfico segue lucrando alguns milhares de reais o país continua gastando bilhões numa guerra falha que encarcera e mata a população negra e pobre.
Em entrevista dada a Mídia Ninja, Henrique, um dos organizadores da edição de Brasília, comentou a ação da polícia:
“A gente sabe muito bem que não é qualquer pessoa que vai presa, a gente sabe que as pessoas que são presas hoje por tráfico de drogas no Brasil mais de 70% são jovens, negros e da periferia. É uma criminalização da pobreza sim! É uma tática de controle da periferia sim! É puro reflexo de racismo.”
Diante do acontecido, conversamos com o Adriano Andrade, advogado e membro da Rede Jurídica pela Reforma da Política de drogas – REFORMA que estava presente no ato e pode falar um pouco mais sobre a ação.
Segundo Adriano, a operação policial deteve aproximadamente 35 jovens, entre eles 2 menores, que foram encaminhados à Delegacia da Criança e do Adolescente. Todos por porte de maconha para consumo pessoal.
“A meu ver o ambiente político atual tem se mostrado muito propício à repressão estatal de qualquer livre manifestação social que afronte os interesses do status quo representado pelo atual governo federal interino. A Marcha da Maconha têm como um dos principais pilares a defesa da paz entre todos e não foi diferente nesta edição”, disse o advogado ao ser questionado se a marcha apresentou algum fato que justifica-se tal ação. “O bloco ainda não havia saído do ponto de encontro quando a polícia chegou com extrema violência. Depois é que soubemos que essa já era uma operação orquestrada pela SSP, denominada ‘Tolerância Zero’, nome importado de uma política norte-americana que funciona na base do ‘atira primeiro, pergunta depois”, complementou.
Comprovadamente, através de fotos e vídeos, a maioria dos detidos eram negros, há alguma relação entre as prisões e o perfil dos jovens? “A relação mais uma vez se mostrou claríssima. O que vemos nas abordagens nas ruas vimos de forma concentrada. Quase duzentos policiais cercaram o ponto de encontro e todos os jovens, maioria negros, e com o estereótipo das periferias do DF foram sumariamente parados e revistados.”
Infelizmente vimos entre as prisões o caso de um cultivador, que levou um pé de maconha para manifestação e teve não só este como as outras 14 plantas aprendidas em sua residência após ser conduzido pela polícia. Apesar de alguns o criticarem, vemos o ato do Michel (44 anos) como mais uma ação militante. Qual é sua opinião sobre o caso?
Não estamos acompanhando o caso do Michel, mas o caso é que se trata de uma Marcha da Maconha e para muito além de uma desobediência civil, defendemos que o plantio caseiro para uso privativo é uma obediência constitucional. Um fato interessante é que no mesmo dia que ocorreu a Marcha da Maconha, o jornal local da Globo apresentou em sua edição noturna uma matéria sobre um curso de cervejeiro que estava ocorrendo em Brasília, onde os mestres ensinavam aos alunos a arte de degustar, de harmonizar com pratos específicos, de conhecer a grande variedade de cervejas artesanais, etc. É contra essa hipocrisia que ainda temos que lutar muito, cursos caríssimos que vendem aos jovens da classe média o direito à felicidade pelo uso de uma droga que está associada a mais de 90% dos casos de violência doméstica, acidentes de trânsito fatais e é a segunda que mais mata depois do cigarro, que é o álcool; e no mesmo dia jovens da periferia sendo humilhados porque preferem usar outro tipo de droga e cuja violência está atrelada não ao uso em si, como o álcool, mas à intervenção do Estado Policial na intimidade e privacidade do pobre. Mas apesar disso tudo a Marcha correu sem qualquer caso de violência, como sempre. Foi uma festa muito bonita e congregou várias famílias, disse Adriano.
Por fim vale salientar que nós do Smoke Buddies repudiamos a ação da Polícia do Distrito Federal e lembrar que o Supremo Tribunal Federal garantiu a legalidade das Marchas da Maconha com a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF 187, aprovada por unanimidade pelos ministros.
Em tempos, isso tudo poderia ter sido evitado se o STF já tivesse julgado o o processo de descriminalização do consumo da maconha outras drogas. O Re 635.659, já recebeu três votos favoráveis, mas no entanto o processo ainda não tem prazo para ser finalizado já que o ministro Teori Zavascki pediu “vista” e ainda não devolveu junto com seu voto.
Fotografias do artigo via Flickr | Mídia Ninja
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