Justiça absolve publicitário preso com 21 pés de maconha em São Paulo

Foto, em vista diagonal, de um martelo de juiz sobre sua base, ambos de madeira, sobre uma superfície também de madeira, junto a uma porção de buds de maconha (cannabis).

A decisão, de segunda instância, foi publicada nesta semana e surpreendeu especialistas em direito criminal. O tribunal paulista é visto como conservador nesta área, pois normalmente condena réus detidos com quantidade razoável da droga plantada. As informações são da Folha de S. Paulo

O Tribunal de Justiça de São Paulo absolveu um publicitário de 30 anos da acusação de tráfico de drogas após ele ter sido preso com 21 pés de maconha em seu apartamento na Vila Madalena, bairro da zona oeste da capital.

A decisão, de segunda instância, foi publicada nesta semana e surpreendeu especialistas em direito criminal. O tribunal paulista é visto como conservador nesta área, pois normalmente condena réus detidos com quantidade razoável da droga plantada.

O caso ocorreu em 3 de janeiro de 2015. No dia, vizinhos do publicitário Maurício (nome fictício) chamaram a Polícia Militar após perceberem que o som da casa estava ligado havia três dias. Suspeitavam que algo poderia ter acontecido com o rapaz.

Os PMs entraram no apartamento com uma escada. Maurício estava desacordado na sala. Em outro cômodo, os PMs encontraram 21 pés de Cannabis sativa L, conhecida como skunk (espécie de maconha mais forte).

O publicitário foi preso em flagrante, acusado de tráfico. Os policiais disseram que ele confessou o crime informalmente ao ser preso –na delegacia e em juízo, Maurício negou e disse que cultivava maconha para consumo próprio.

Para a polícia, os 21 pés pesavam 583 gramas. Um botânico contratado pela defesa afirmou que a quantidade consumível da droga era de 80 gramas. Isso porque nem toda a planta é usada como entorpecente e, se for um exemplar macho, por exemplo, ele não floresce e não pode ser utilizado para este fim.

Momentos após a prisão, uma equipe da TV Record entrou na casa do publicitário. Na reportagem, disponível no site da emissora, ele foi tratado como “traficante de classe média-alta” que vendia drogas na Vila Madalena. A versão dele não foi contemplada.

Maurício ficou preso por três meses –três habeas corpus foram negados. Em março de 2015, ele foi condenado a 1 ano e 8 meses de prisão, mas a pena foi substituída por uma punição mais leve.

Seu defensor, Alexandre de Oliveira Ribeiro Filho, advogado do grupo Vilardi, recorreu da decisão. “Ele não é traficante, era usuário. Nunca o investigaram. Ele foi condenado com base na quantidade de plantas e na palavra de um policial”, diz o defensor.

Agora, desembargadores absolveram o publicitário. “Não há nos autos prova cabal, segura e induvidosa que venha a sugerir que se trata de um mercador de produto proibido”, escreveu o desembargador Marcelo Gordo, relator do caso, na decisão.

INVESTIGAÇÃO

Plantar maconha é crime. A lei não determina a quantidade de drogas que pode ser enquadrada como tráfico. O que vale é a intenção –um flagrante de venda, por exemplo. Para Felipe Gonçalves, mestre em direito pela FGV-SP, absolvição como a de Maurício é caso raro em SP.

Para sua dissertação de mestrado, Gonçalves analisou 135 decisões do TJ-SP que tratavam como traficantes pessoas que plantavam cannabis.

“A palavra do policial que fez a prisão é o maior instrumento de prova para condenação por tráfico. Não há investigação. O processo costuma ser encerrado após o flagrante, um absurdo”, diz.

A lei cita outros comportamentos que podem pesar, como “conduta social” e “personalidade”. “São conceitos vagos que não dizem nada”, diz.

Cristiano Maronna, vice-presidente Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, concorda. “Existe uma presunção de tráfico. O cultivador é quem precisa provar que não é traficante, e não o Estado provar que ele, sim, praticou o tráfico. Essa decisão surpreende dado o conservadorismo com que o tema é tratado em São Paulo”.

Na decisão, o TJ também pediu uma investigação sobre a conduta dos PMs. Um laudo da polícia apontou que o publicitário tinha lesões após a prisão. No processo, ele diz que, na abordagem, levou um soco e um pontapé dos PMs.

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