De atividade criminosa à legalidade: como a maconha virou um negócio bilionário

Fotografia de uma pequena porção de buds secos de maconha, com pistilos marrons e laranjas, sobre um feixe de notas de dólar, em fundo escuro e iluminação focada.

No país pai da proibição, onde muita gente foi pra cadeia pelo uso ou comércio de maconha, surge um mercado bilionário da erva que, de mercadoria criminosa, virou mainstraem. As informações são da Época Negócios.

Em 1995, a Califórnia se tornava o primeiro estado americano a permitir o uso medicinal da maconha. Na mesma época, um jovem chamado Troy Dalton decidiu que trabalharia para que o mesmo ocorresse nos outros 49 estados do país – e não apenas para casos médicos, mas também para o uso recreativo.

Passados quase 25 anos, a situação é outra: 10 estados americanos, mais o Distrito de Colúmbia, legalizaram completamente o cultivo e consumo da droga. Outros 33 permitem o uso medicinal da planta. Deste total, 14 têm restrições ao tetraidrocanabinol, o princípio ativo alucinógeno da maconha, mas permitem o consumo de canabidiol, substância que não “dá barato” e é usada, por exemplo, no tratamento de epilepsia.

Polêmica como poucas, a indústria da maconha cresce mundo afora. Num ritmo muitas vezes alucinante. No ano passado, o setor registrou uma alta de faturamento de 28,8%, chegando a US$ 12,9 bilhões. A expectativa é que esse número passe para US$ 17 bilhões em 2019 e encerre 2022 em US$ 31,6 bilhões. Apenas nos Estados Unidos, a indústria da cannabis emprega cerca de 200 mil trabalhadores. Os empresários da maconha têm motivo para otimismo. Em 2018, o Canadá legalizou a erva, juntando-se ao Uruguai, que havia feito o mesmo em 2013. Em terras americanas, 66% dizem hoje ser favoráveis à legalização.

Essa força toda fez com que o SXSW, célebre evento de inovação e economia criativa, em Austin (EUA), inaugurasse esse ano uma programação especial para “os negócios da maconha”. Um dos empreendedores do setor que se apresentou nesta quinta (14/3) é exatamente o fundador e CEO da Arcview, Troy Dalton. A empresa atua como um fundo de investimentos de startups de cannabis e também faz pesquisas de mercado. São delas os números acima.

Adam Bierman, fundador da MedMen (Foto: Getty Images)

#PraCegoVer: fotografia de Adam Bierman vestindo jaleco e calça de cor escura e sentado em uma poltrona de cor clara, com o calcanhar apoiado sobre o joelho, gesticulando com uma mão e segurando um microfone com a outra. Créditos: Getty.

Adam Bierman, fundador da MedMen, a maior rede varejista de maconha dos EUA,  foi outro nome de peso que palestrou no SXSW. O executivo já conseguiu levar sua empresa ao mercado de ações. Os papéis estão listados na bolsa de Toronto, no Canadá. Conhecida como a Starbucks da maconha, a MedMen tem 19 unidades, entre lojas e fazendas, em locais onde a erva é legalizada e aposta num visual elegante e funcionários bem treinados para encantar seus clientes. “As nossas lojas são desenhadas para serem como qualquer outra. Queremos passar a sensação de normalidade. Além do público que já era usuário de maconha, queremos também atrair aqueles clientes que não consumiam a droga antes de ela se tornar legal”.

Tanto Dalton quanto Bierman passaram por maus bocados antes da “nova era da maconha” surgir nos Estados Unidos. Dalton fundou a Arcview em 2009. Começou o negócio com um aporte de Steve DeAngelo, pioneiro na luta pela legalização da erva, conhecido como o pai da indústria da cannabis nos EUA. Apesar de ter um padrinho de peso, a Arcview não decolou. “Especialmente entre o fim de 2011 e o começo de 2012, tive um período muito complicado. Por seis meses, cheguei a dormir no meu carro”, afirma. Já Bierman conta ter tido dificuldades em pagar o aluguel de seu apartamento antes de a MedMen decolar. “Se já é difícil criar um negócio, imagine fazê-lo enquanto se constrói uma indústria”, diz.

Para o fundador da Arcview, a situação começou a melhorar em novembro de 2012, quando o estado do Colorado aprovou a legalização da cannabis em seu território. “Com o fim da proibição no estado, oportunidades de negócios começaram a surgir. Conforme o tempo passou, outros estados aprovaram medidas que flexibilizavam o consumo da droga. Um mercado vibrante e lucrativo foi surgindo”, afirma.

Segundo Dalton, o crescimento exponencial da Arcview desde então – a empresa tem cerca de US$ 100 milhões em investimentos em startups – fez parecer que ele e o fundo surgiram do nada. Mas não foi assim. “Eu luto pela legalização da maconha desde a década de 1990 e sofri bastante antes de o mercado chegar ao ponto atual”.

E o ponto atual é bastante interessante. Pela primeira vez na história, os candidatos à presidência dos Estados Unidos em 2020 terão de responder se são favoráveis à legalização da maconha, projeta Bierman. “Será uma discussão inédita”, diz. As chances de eles se posicionarem a favor do mercado de cannabis crescem a cada dia. Grandes empresas, como Coca-Cola e AB InBev, já anunciaram estudar investir no setor. “A questão não é se as gigantes farmacêuticas e as grandes empresas de tabaco e álcool irão investir no mercado de maconha. Elas já participam dele. Teremos, na realidade, as gigantes da maconha”, afirma o dono da MedMen.

Troy Dalton, fundador da Arcview (Foto: Adriano Lira)

#PraCegoVer: fotografia de Troy Dalton vestindo casaco e calça de cor escura e sentado em uma poltrona de cor clara, com o calcanhar apoiado sobre o joelho e as mãos sobre os braços da poltrona; logo atrás dele, pode-se ver parte do logo da SXSW 2019.

De acordo com Dalton, a legalização da maconha nos 50 estados americanos é possível – e quase beira o inevitável. Mas sua luta não vai acabar por aí. “Comecei buscando o fim da proibição em todos os Estados Unidos. Mas a grande maioria dos países proíbe a maconha. Por mais que chamemos o nosso mercado de indústria, ainda somos um movimento. Só seremos uma indústria de verdade quando ninguém mais for para a cadeia por plantar, vender ou consumir maconha”, diz.

A vida, de fato, não é fácil para os empreendedores de cannabis. Como a erva não é legalizada federalmente nos Estados Unidos, eles sofrem com diversas restrições, principalmente no sistema bancário. Receosas de serem processadas por manter relacionamento com empresas da maconha, muitas instituições financeiras simplesmente se recusam a manter contas para esses negócios. “Eu tenho a varejista com o maior número de vendas por metro quadrado do mundo atualmente e não consigo ter aprovado um empréstimo no banco”, reclama Bierman. Pode não servir de muito consolo agora, mas esses dias, ao que tudo indica, irão em breve chegar ao fim. A indústria da maconha – gostem ou não – virou mainstream.

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#PraCegoVer: fotografia (de capa) em close de uma pequena porção de flores secas de maconha, com pistilos marrons, sobre um feixe de notas de dólar; com um fundo escuro e iluminação focada.

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